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Doe algo que você gosta

Por Luciano Ribeiro com PDH 29/04/2019 11h11
Doe algo que você gosta
Reprodução

Normalmente, quando ouvimos falar em desapego, pensamos naquilo que está acumulado, que não serve mais.

Claro que há o seu valor em doar algo que está parado, mas se olharmos com um pouco de atenção, talvez haja um contrassenso nessa prática.


Doar aquilo que não mais nos fisga não é realmente lidar com o apego. Afinal, se aquele objeto já perdeu o brilho e está ali encostado, significa dizer que o próprio apego a ele já se desvaneceu. Assim, se você se livra dele, não há uma energia muito poderosa na ação, pelo menos no que diz respeito ao desafio proposto.

Claro que é melhor do que nada. Afinal, não deixa de haver um exercício de generosidade, de pensar em quem pode se beneficiar daquilo e isso, em si, é super interessante.

Porém, é possível também aumentar a dificuldade e realmente tentar desafiar-se, testar seus limites e ver até onde você realmente consegue se doar e agir de forma menos autocentrada e mais generosa.

Uma das melhores formas é ir contra o impulso do gostar e do desejo de agarrar causados pelo apego.

Esse impulso é um dos mais poderosos que temos em nós. A nossa vida inteira temos como base de praticamente todas as nossas ações um eixo de agarrar aquilo do que gostamos e rejeitar aquilo que nos é desinteressante ou do que não gostamos. Isso é praticamente o motor central. É difícil até pensar em algo que façamos, normalmente, que não inclua de alguma forma esse impulso básico.

Assim, livrar-se de um objeto querido é um gesto extremamente subversivo, uma rebeldia, uma afronta.

Por isso, a prática dessa edição da nossa coluna é: doe algo que você gosta.

Não um objeto escondido no fundo do guarda-roupa, mas sim aquele que causa as mais tenras lembranças. Um presente de alguém querido. Algo que você queria muito e foi difícil de conseguir. Você escolhe.

Não precisa ser nada caro. A única regra é que o objeto tenha significado. Quanto mais imantado melhor.

Pra ajudar, já digo o que fiz. Eu tinha uma caixa de som ótima, de excelente qualidade. Com ela eu já animei festas, toquei em aniversários de amigos e utilizava pra ensaiar dentro de casa. Tenho um amigo que estava montando uma casa e resolvi dar a ele de presente, principalmente porque ele é bem mais festeiro que eu. Foi um presente que pra mim teve um custo alto, tanto financeiro quanto emocional e é algo que eu dificilmente faria. Mas torcendo um pouco o bico pela loucura, fiz assim mesmo (e até já flertei com o arrependimento).

Vale aproveitar a oportunidade pra observar bem essa estrutura do apego, ver como o corpo reage, de que forma a gente acaba se retorcendo pra não fazer isso.