Agro
Açúcar ainda deve remunerar mais que etanol
Na próxima temporada (2024/25), que começa em abril, a diferença tende a diminuir, mas não o suficiente para que as usinas voltem suas unidades para a produção de etanol
Na safra sucroalcooleira que está terminando (2023/24), o açúcar teve um prêmio histórico em relação ao etanol, garantindo que as usinas direcionassem o máximo possível de sua cana para a produção da commodity, em detrimento do álcool. Para a próxima temporada (2024/25), que começa em abril, a diferença tende a diminuir, mas não o suficiente para que as usinas voltem suas unidades para a produção de etanol.
Os contratos do açúcar negociados na bolsa de Nova York estão cerca de US$ 0,09 a libra-peso mais altos que o preço do etanol hidratado para as usinas de Ribeirão Preto convertido ao valor do açúcar. Essa diferença, que já esteve em US$ 0,11 a libra-peso, tende a apertar na próxima temporada, mas não deve sumir.
O estreitamento dessa “boca de jacaré” — o formato atual do gráfico de preços de açúcar e etanol — deve refletir uma redução da produção de etanol de cana. Nesta safra, a produção do biocombustível superou expectativas com a forte colheita da matéria-prima, pressionando a oferta.
“Estão vindo dados muito ruins de chuvas. Vamos ter com certeza alguma redução na oferta de cana”, disse Willian Hernandes, sócio da consultoria FG/A. Por ora, a empresa prevê uma redução de 5% na moagem na próxima safra, mas a estimativa ainda pode mudar a depender das chuvas do primeiro trimestre de safra, de abril a junho.
Para ele, a menor oferta de cana deve afetar de forma concentrada a produção de etanol, já que as usinas devem continuar priorizando o açúcar.
Estimativas
A FG/A estima que a produção de açúcar pode até aumentar, dados os investimentos feitos em novas fábricas por parte de empresas que só tinham destilarias, além de investimentos para ampliar a capacidade de produção da commodity. A consultoria projeta que, para a próxima safra, entrará em operação uma capacidade adicional de 2 milhões de toneladas, e para as seguinte (2025/26), mais 1,5 milhão de toneladas em capacidade.
Para a oferta de etanol hidratado, a FG/A estima uma redução no volume total em 2,5 bilhões de litros em relação à atual, voltando aos níveis da temporada 2022/23. Naquele ciclo, os preços do biocombustível ficaram em média em 70% ante a gasolina, bem em cima da paridade entre os combustíveis, o que costuma atrair o motorista de carro flex para o renovável.
“Pode ser que tenhamos um ano de mais convergência de preços [entre açúcar e etanol]”, avalia Hernandes. “Não a ponto de equilibrar, mas podemos viver um cenário de etanol um pouco melhor e de preço de açúcar levemente menor.” Ele estima que a remuneração do açúcar, hoje 50% acima do etanol, deve cair a 25% em 2024/25.
A recuperação dos preços do etanol, porém, depende do comportamento da demanda, que no ano passado decepcionou e só começou a reagir neste ano. “Pode ter uma tendência de fechamento da boca de jacaré se a recuperação da demanda se mantiver na próxima safra”, afirma Lívia Coda, analista da consultoria hEDGEpoint. Ela aposta em uma recuperação do etanol caso o consumo o ciclo Otto surpreenda e cresça 2,5% este ano.
Porém, ainda que o preço do etanol suba, ficará bem distante da remuneração do açúcar. Segundo Marcelo Filho, analista da StoneX, o etanol hidratado recebido pelas usinas teria que superar R$ 4 o litro — ou seja, praticamente dobrar de preço em relação aos valores atuais. “Isso não vai acontecer”, afirma. Para ele, o fechamento da boca de jacaré “é uma tendência de médio prazo” e “gradual”.
Além disso, para que um encurtamento do prêmio ocorra, o preço do açúcar não pode reagir, o que não está garantido. Mesmo com o aumento da oferta brasileira, a próxima safra da Índia e da Tailândia ainda está longe, e a demanda segue firme. “A demanda continua crescendo e o mercado fica mais apertado”, avalia Coda.
A oferta crescente de etanol de milho também tem afetado a dinâmica do mercado, elevando a pressão sobre as cotações, mesmo na entressafra de cana. Isso dificulta altas mais fortes do etanol, observa Marcelo Filho.