De Belchior a Shakespeare: a poesia de Rafael Nolli
Gosto de surpresas. Gosto de passar as páginas de um livro e de repente voltar para ler outra vez um trecho que ficou na cabeça. Gosto de um livro que continua comigo depois da leitura, falando e me fazendo pensar, como um parceiro/companheiro vai me acompanhando, ultrapassando o limite da última página e tornando-se íntimo do meu cotidiano.
Gosto da intimidade estranha que o livro proporciona, os versos, as conexões as tantas formas de ver a mesma coisa. Quando recebi o belo livro ELEFANTE (Araxá: Coletivo Anfisbena, 2012) do poeta mineiro Rafael Nolli, logo nas primeiras páginas esse ar impregnado de ansiedade, igual àquela que nos assola na antessala do dentista, quando ouvimos aquele som, temido, "daquela broca procurando cárie", fui pego pela poética do autor, uma sensação ofegante e com gosto de vida em cada um dos poros.
A poesia de Nolli é desautomatizada e livre de amarras, sua poesia, leva a encontros, leva ao sentir mais perplexo e pulsante. Sua poesia intercala com Belchior e Shakespeare, Paul Valéry e Pink Floyd, diálogos densos e chocantes que levam o leitor por caminhos labirínticos onde o fio condutor ao mesmo tempo que desnorteia, também serve de bússola.
O lirismo pungente é sem pastiches, apenas poesia, forte e simples. Os versos são curtos, são diretos, travestidos numa subversão das convenções teóricas. O autor mostra a palavra e o sentir: "palavra por palavra//para por de pé o poema://bateia roendo o leito do rio".
Uma leitura, um livro, um leitor arrebatado! Uma poesia a ser compartilhada.