Adalberto Souza

CULTURA

Baseado em Causos Reais

29/12/2014 09h09

Uma rua, idas e vindas apresadas, pessoas-mundos transitando em suas vidas-casulos. Transbordando silenciosas histórias, prontas para serem lidas-escritas. É isso que propõem o escritor Daniel Viana em seu livro Baseado em Causos Reais (Ed. do Autor; São Paulo, 2014)

“CANÇÃO EM SÓ MAIOR
Me cante uma canção
de aquietar o coração.
quero descansar – ando
cansado de te inventar.” (p. 84)

Um escritor pronto para transformar ao som tec-tecs da máquina de datilografia essas histórias de delicadezas em contos-poesias. Um cartaz anuncia em qualquer rua, em qualquer lugar: " Troco um causo por um conto". E assim começa a intrigante e genial ideia do mineiro Daniel Viana.

“CAFÉ DA MANHÃ
– Mãe, como se chama quando
 a gente ouve uma música e
fica triste de felicidade?
– Saudade.” (p.13)

Rodando algumas cidades do pais, ouvindo as pessoas, transformando-se num escutador, das paisagens, dos cheiros da terra, das palavras ditas e das que ficam no fundo dos olhos. Que ninguém se engane, escutar é muito mais difícil do que parece. As pessoas estão sempre prontas para soltarem suas línguas e falarem, mas, encontrar alguém disposto a parar e escutar e, mais ainda, transformar em arte esse palavrear, não é nada fácil.

Perceber o singelo das histórias desconhecidas, o lirismo e a urgência do cotidiano fez nascer um livro singelo, como a vida nas entrelinhas. Esse desafio, proposto e aceito pelo autor é visto como uma terna e urgente força. Nessa aparente simplicidade toda a força narrativa e a interessante descoberta de que cada vida, se olhada - ou melhor - escutada com sensibilidade ou simplesmente ouvida, resulta em poesia.

“AVALIAÇÃO MÉDICA
– O que você sente?
– Eu sinto muito.” (p. 12)

Uma história aqui, outra ali, um filho que parte, um amor que acaba, uma amada inatingível, histórias que poderiam ser do nossos vizinhos, amigos, inimigos. A poesia é simples e pungente, todo narrador, para tornar ainda mais verossímil a transposição literária da vida, é transformado em Joaquim.
Esse personagem permeia todo o livro. É ele quem vai sofrer as dores do amor, as felicidades das pequenas coisas. Transformar o cotidiano em poesia. Ocupará várias páginas com a leveza e a fúria da existência.

A história do outro universalizada numa obra interessante/interessada. Interessada em compartilhar experiências e dessa forma transformar o mais simples gesto individual em uma vivência de todos.  Daniel enxerga naquela coisa simples a majestade e a intensidade do cotidiano.

“FIM
Era surpresa. Era segredo.
Era amor. Era para sempre.
Era para ser tanta coisa.
Era para ser tanto causo.
Mas acabou. O amor acaba!
Fim.” (p. 65)

Um livro que deixa a impressão que os causos retratados são nossos também. Uma ideia que deveria ser propagada. Escutar e transformar, com sensibilidade.

 

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