Antiga Fábrica da Pedra se transforma em Shopping da Vila
Galpões da fábrica da Pedra - fundada por Delmiro Gouveia - são transformados em um complexo de empreendimentos no sertão alagoano
Artigo: Edvaldo Nascimento
Professor Dr. em Teoria e História da Educação pela UFPE
O cearense Delmiro Augusto da Cruz Gouveia é considerado por muitos como o pioneiro da industrialização do sertão do São Francisco. Ele fundou um Núcleo Industrial no lugarejo de Pedra, município de Água Branca. Sob seu comando foi construída a Usina Hidrelétrica de Angiquinho, primeira hidroelétrica do Nordeste, inaugurada em 26 de janeiro de 1913. Também foi desse comerciante a ideia de construir um núcleo residencial e uma fábrica de linhas. A partir da inauguração da usina hidroelétrica e da fábrica, o Núcleo Fabril da Pedra vai se transformar segundo palavras de Plínio Cavalcanti, primeiro a escrever sobre o núcleo industrial sertanejo, numa colmeia de trabalho e ordem social. Chegou a ter quatro mil pessoas nos primeiros anos de atividades. Com o assassinato de Delmiro Gouveia, em 1917, seu sócio Lionelo Iona assume o comando da companhia, tendo a fábrica a gerencia de Adolpho Santos. Desavenças com os herdeiros de Delmiro Gouveia afastam Lionelo Iona do comando da Companhia. Noé Gouveia e as irmãs Noêmia e Maria Gouveia, representadas por respectivos esposos, passam a comandar os destinos da empresa.
A concorrência desleal da Machine Cottons, empresa estrangeira concorrente da fábrica de linhas Estrela, foi intensificada nos anos de 1925 e 1926 levando a indústria de linhas a uma crise econômica. Adicione as dificuldades vividas pelas indústrias têxteis brasileiras que enfrentavam a concorrência das empresas estrangeiras e o baixo preço dos produtos importados. Não suportando as dificuldades e sem tino para os negócios os filhos de Delmiro Gouveia vendem o complexo industrial e comercial fundado no sertão alagoano no início do século XIX.
Em 1927 assumem o comando dos negócios da Companhia Agro Fabril Mercantil o grupo Menezes Irmãos & Cia., tradicional na indústria têxtil pernambucana. Será na gestão dos irmãos Luiz e Vicente Lacerda de Menezes firmado um acordo com a Machine Cottons, para a fábrica encerrar a produção de linhas e entregar as máquinas a sua principal concorrente. Este fato ocasionará em um dos mais trágicos acontecimentos da indústria sertaneja, que teve no início de 1930 parte do maquinário quebrado e jogado penhasco abaixo na cachoeira de Paulo Afonso. O parque industrial é reestruturado e a fábrica passa então a produzir tecidos. Com a morte de Vicente Lacerda de Menezes na década de 1940, seu filho Antônio Calos de Menezes assumiu o comando das empresas. Foi esse empresário que conduziu por mais tempo os negócios da Companhia Agro Fabril Mercantil, e da Fábrica da Pedra. A indústria sertaneja na gestão de Antônio Carlos se consolida como uma das principais do setor têxtil no Brasil. As dificuldades econômicas nas empresas levaram o industrial a cometer suicídio em 10 de maio de 1983.
Ameaçada de paralisar suas atividades a fábrica é adquirida pelo empresário Ivan Botelho em 1986. A razão social da companhia passa a ser Multifabril Nordeste S/A. Apenas oito anos sob o comando do grupo mineiro, o grupo Cataguases Leopoldina vende a indústria para o Grupo empresarial alagoano Carlos Lyra.
Quando assumiu a empresa em 1992, a fábrica da Pedra realizou altos investimentos na modernização do seu maquinário e equipamentos, totalizando mais de 22 milhões de investimentos. Na gestão do empresário alagoano a fábrica têxtil conquista o mercado brasileiro e sul americano. A crise na indústria têxtil internacional trazem uma série de dificuldades para a empresa. A fábrica da Pedra encerrou suas atividades em 2017, tinha 420 funcionários. A indústria sertaneja funcionou por mais de um século como fábrica de linhas e indústria de tecidos e confecções. Com o falecimento do empresário Carlos Lyra coube ao seu genro Fernando Farias reestruturar os negócios do grupo empresarial. Após resolver todas as pendências com funcionários e fornecedores, o empresário alagoano volta-se para planejar o futuro das empresas.
Após o impacto do seu fechamento, o desafio posto ao empresário Fernando Lopes de Farias, era transformar a área localizada no centro da cidade de Delmiro Gouveia, edifícios e galpões em novos empreendimentos. Uma decisão importante foi a de preservar os edifícios que compunham a indústria têxtil, aproveitando-os para novos empreendimentos. Em seguida, realizar estudos de viabilidade e buscar parcerias. É criado então, a Vila da Pedra Empreendimentos Imobiliários, que após ter projeto aprovado firmou contrato com o Banco do Nordeste para a construção do Shopping da Vila, no município do Sertão de Alagoas. A obra iniciada com recursos próprios, será realizada em quatro fases, tendo a primeira previsão de ser inaugurada em julho deste ano. O aporte de R$ 5,7 milhões do BNB, garante o andamento das obras seguindo o cronograma previsto. Já na etapa de reformas o projeto do Shopping gera 50 empregos diretos.
Toda área pertencente a empresa (terrenos, galpões, museu e residências) estará sendo transformada em um ousado projeto de desenvolvimento econômico para o sertão, especialmente para o município de Delmiro Gouveia. O empreendimento Vila da Pedra incorporou todo o patrimônio, os terrenos e os edifícios da antiga fábrica da Pedra. Parte dos terrenos foram destinados para um loteamento em área privilegiada no centro da cidade. Os lotes estão sendo comercializados, tendo uma área para comércio e outra residencial.
Nova destinação para edifícios e galpões da antiga fábrica
Os galpões da antiga fábrica da Pedra terão nova utilização. Alguns foram alugados para terceiros. É o caso do galpão de 3.200 m², onde funcionaram a confecção de calças e posteriormente depósito de algodão e poliéster. Nesse espaço foi inaugurado o Supermercado MIX, que tem ainda uma área de 1.600 m² para estacionamento de carga e descarga. Esse foi o primeiro dos empreendimentos que compõem o complexo do Shopping da Vila a ser inaugurado, gerando 105 empregos diretos. A área onde funciona o agora MIX Supermercado foi totalmente revitalizada, inclusive o símbolo da fábrica e da cidade e a chaminé recebeu reforço estrutural, sendo um belo cartão postal da cidade.
O próximo empreendimento será a inauguração da Escola Santa Rita, que está sendo instalada em uma área de 1.100 m², em um dos três galpões onde funcionou a confecção de camisas, e posteriormente o setor de acabamento que era composto por alvejamento, tinturaria e estampa da fábrica. A escola manterá uma área destinada para a praça. Esse estabelecimento educacional gerará 45 empregos e tem perspectiva de atender 600 estudantes.
Já estão bastante avançadas as obras nos galpões onde funcionaram o almoxarifado e o galpão de estoque de peças e acessórios têxteis, para funcionar o DR Home Center, que será inaugurado em março. Esse na primeira fase funcionará em uma loja com 1.000 m². Será construído no local onde existiram os tanques de água um galpão com 4.000 m², também para atender o Home Center. De início são mais 30 empregos diretos.
Em andamento está o mais esperado empreendimento do empresário Fernando Lopes de Farias, o Shopping da Vila, primeiro estabelecimento de gênero na região. Funcionará no edifício mais antigo da fábrica da Pedra. O Shopping funcionará no prédio onde foi setor de encarretamento, embalagem e confecção de linhas, quando de seu funcionamento em 1914, e depois de sua reestruturação pelos irmãos Menezes, preparação para tecelagem, urdideira e engomadeiras indianas, em uma área de 6.600 m². Quando concluídas as etapas seguintes o Shopping utilizará os 8 galpões da fábrica no prédio principal, em um total de 14.000 m².
O projeto arquitetônico foi da arquiteta Humberta Farias e teve a consultoria histórica do Pesquisador Edvaldo Nascimento, estudioso da vida e obra de Delmiro Gouveia. A primeira etapa tem previsão para ser inaugurada em julho. No Shopping da Vila funcionarão agências bancárias, cinemas, lojas e praça de alimentação.
Assim, a área onde outrora funcionou a fábrica da Pedra com seus edifícios e terrenos vai sendo transformada em novos empreendimentos. Para o Assessor da diretoria do Vila da Pedra Empreendimentos Imobiliários, Jorge Luiz Cavalcanti, responsável direto pela condução do projeto, o Shopping vai gerar 250 empregos diretos. O sertão alagoano no início do século XIX foi palco de um ciclo de industrialização. Pouco mais de um século após, a região tem crescido significativamente, especialmente o município de Delmiro Gouveia, que transformou-se em polo educacional com um Campus da Universidade Federal de Alagoas, de serviços com diversos órgãos públicos que realizam atendimento à população da região, além de ser um dos principais roteiros turísticos do Estado. Com esses novos e importantes empreendimentos, além de gerar empregos e renda, manterá viva a história do seu fundador Delmiro Augusto da Cruz Gouveia. Aliás, o primeiro grande empreendimento de Delmiro foi o Mercado do Derby, fundado por ele no Recife, o primeiro Shopping Center do Brasil. Agora, o edifício onde funcionou por mais de um século uma indústria símbolo da industrialização na região do sertão sediará o primeiro empreendimento do gênero no sertão do São Francisco: um shopping center, que tem como nome: Shopping da Vila, em homenagem ao núcleo urbano fundado por Delmiro Gouveia. Sem dúvida alguma, Delmiro Gouveia, Vicente e Luiz Lacerda de Menezes, Ivan Botelho e Carlos Lyra são empreendedores que apostaram no sertão e acreditaram na sua gente. Agora, é o empresário Fernando Farias que aposta no projeto idealizado por Delmiro Gouveia, reestruturando para os tempos atuais, o desenvolvimento dessa região.