Negociando com o governo

Administração pública, negócios públicos, licitações e temas sobre gestão. Por Fabio Monteiro.


Exclusivo: Procurador do Estado do Paraná explica sobre a atuação dos advogados públicos sob as novas regras das contratações públicas

Dr. Hamilton Bonatto, Procurador do Estado do Paraná e renomado especialista na área das contratações públicas, abordou as perspectivas e os desafios que estão diante dos procuradores e advogados que trabalham com licitações e contratos administrativos

Por Fábio Santos 18/10/2023 09h09 - Atualizado em 18/10/2023 10h10
Exclusivo: Procurador do Estado do Paraná explica sobre a atuação dos advogados públicos sob as novas regras das contratações públicas
Dr. Hamilton Bonatto, é Procurador do Estado do Paraná - Foto: Divulgação

Em um cenário onde as contratações públicas ganham cada vez mais destaque e relevância, é fundamental contar com profissionais qualificados e experientes para orientar e garantir a legalidade nesse processo complexo. Sob a égide da Lei nº 14.133/2021, a figura do advogado especializado em contratações públicas desempenha um papel fundamental na salvaguarda dos interesses do Estado e da sociedade. No intuito de aprofundar nosso entendimento sobre esse assunto crucial, tivemos o privilégio de entrevistar o Dr. Hamilton Bonatto, Procurador do Estado do Paraná e um reconhecido especialista nessa área. Com uma trajetória acadêmica e profissional notável, Bonatto é um profundo conhecedor dos avanços do direito público e das políticas que regem a construção de obras públicas no Brasil. Nesta entrevista, mergulhamos em sua vasta experiência e perspectivas sobre os desafios e oportunidades que envolvem as contratações públicas no Brasil.

Apresentando Nosso Entrevistado

Acesse a página pessoal do Dr. Hamilton Bonatto clicando AQUI

O Dr. Hamilton Bonatto, atual Procurador do Estado do Paraná, é uma figura de destaque no mundo jurídico brasileiro, especialmente quando se trata de contratações públicas. Sua sólida formação acadêmica inclui graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Engenharia Civil pela Universidade Federal do Paraná e graduação em Ciências com habilitação em Matemática pela Fundação Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Paranaguá.

Bonatto possui especializações em Direito Constitucional, Advocacia Pública, Construção de Obras Públicas e Ética e Educação com ênfase em Teologia Moral. Além disso, o aprimoramento contínuo o levou a obter o título de Mestre em Planejamento e Políticas Públicas pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná. É co-autor do excelente compêndio intitulado “Regulamentação Municipal da Lei Nº 14.133/2021”, recentemente publicado pela Editora Forseti, no qual, juntamente com outros dois especialistas, transferem aos Municípios as experiências adquiridas nas suas carreiras públicas, e oferecem, como isso, um grande número de ferramentas para o êxito das licitações e contratações públicas.

Com essa notável trajetória acadêmica e profissional, Dr. Hamilton Bonatto é uma referência quando se trata de assuntos relacionados às contratações públicas, contribuindo para o desenvolvimento e aperfeiçoamento das políticas que regem as obras públicas no Brasil. A seguinte entrevista esclarece sinteticamente a abrangência da advocacia pública na evolução e no desenvolvimento dos métodos controladores das contratações públicas.

O novo regimento licitatório brasileiro (Lei nº 14.133/2021) institui em seu artigo 7º a segregação de funções dos agentes públicos, incluindo os órgãos de assessoramento jurídico e de controle interno da Administração. Qual o impacto dessa inovação legislativa para o assessoramento jurídico nos municípios de pequeno porte?

Primeiramente vale mencionar que o dispositivo da Lei nº 14.133/2021 relativo ao princípio da segregação de funções de modo geral é bem-vindo, de modo que veda a designação do mesmo agente público para atuar de forma sequencial ou simultânea em funções interdependentes. Há um claro objetivo de evitar fraudes, reduzindo, como explicita a Lei, a possibilidade de ocultação de erros e de ocorrência de fraudes na respectiva contratação. Tal dispositivo aplica-se ao assessoramento jurídico e ao controle interno da Administração.

Não há dúvidas que os municípios, especialmente aqueles de pequeno porte, terão dificuldade em cumprir a fria letra da lei, tendo em vista a carência de recursos humanos nesses entes. Com isso, vejo que, como regra, esse dispositivo deve ser temperado na sua aplicação.

No entanto, quando se trata de assessoramento jurídico e controle interno, penso que não é caso que haja possibilidade de qualquer temperamento, tendo em vista as características de suas atuações, seja pelo controle da legalidade de um, ou em função do controle da gestão do outro.

Desde a promulgação da Lei nº 14.133, em 1º de abril de 2021, vimos uma efetiva atuação da Advocacia Geral da União em auxiliar os órgãos federais responsáveis na regulação da lei. Como os advogados públicos das demais esferas governamentais podem se beneficiar dessa disposição da AGU?

É louvável a atuação da AGU no sentido de orientar e prover os órgãos da Administração Direta, autárquica e fundacional da União de instrumentos que facilitam a adoção da Lei nº 14.133/2021, especialmente as minutas padronizadas.

A Advocacia Públicas dos demais entes, principalmente aqueles que ainda não produziram esses instrumentos legais, podem buscar a produção da AGU como inspiração, porém, e isso é muito importante, é necessário perceber que a realidade vivida pela União é diferente da vivida pelos Estados e, muito mais diferente ainda da vivida pelos municípios, em especial aqueles de menor porte.

O trabalho da AGU e de alguns Estados que já fizeram a lição de casa, como é o caso do Paraná, deve servir de inspiração, porém a utilização dos instrumentos criados por essas advocacias públicas deve ser adaptada à realidade local, sob pena de criar complicadores em suas licitações e contratos.

Não gosto e não tolero a expressão “meu dinheiro, minhas normas”. Esse comportamento do Governo que passou me causou aborrecimento. Desconsidera que as normas de um ente são escritas conforme a sua própria realidade, É necessário respeitar sua autonomia dos entes federativos. Razão esta, por analogia, entendo que as minutas padronizadas, por exemplo, devem ter cheiro, som e gosto local e, evidentemente, dentro das fronteiras legais e constitucionais.

 Considerando sua expertise em direito público e engenharia civil, podemos afirmar que o novo regramento licitatório para obras e serviços de engenharia complexos proporcionará melhores resultados no andamento e na conclusão das obras entregues pelo poder público?

Não tenho dúvidas que a Lei nº 14.133/2021 oferece muito mais condições do que a legislação que será revogada no que diz respeito de executar obras e serviços de engenharia com maior qualidade, rapidez, com mais tecnologia embarcada.

Para isso inova no próprio conceito de obra, indo além do conceito anterior; traz o conceito de serviços de engenharia como residual ao de obra; herda de outras leis instrumentos importantes como alguns regimes de execução, a possibilidade do orçamento sigiloso; a extraordinária metodologia do Building Information Modeling – BIM como preferencial em relação às tradicionais, trazendo uma nova cultura projetual para a Administração Pública; dá prioridade à tramitação os licenciamentos ambientais de obras públicas nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama) e prevê a possibilidade de o contratado se responsabilizar pela obtenção do licenciamento ambiental; impõe a obrigatoriedade da matriz de riscos para os regimes de empreitada contratação integrada e semi-integrada e para obras de grande vulto, sem que proíba sua utilização para os outros regimes de execução; reformula a forma de cálculo para verificação de que se há indício de inexequibilidade; possibilita e dá os requisitos para a utilização do sistema de registro de preços para obras e serviços de engenharia; traz a possibilidade de exigência de seguro-garantia para as obras e serviços de engenharia, e com cláusula de retomada; insere o procedimento de manifestação de interesse – PMI; inaugura a modalidade Diálogo Competitivo; obriga antes de qualquer decisão a respeito da realização de um empreendimento público a elaboração de um Estudo Técnico Preliminar; exige um sistema informatizado para o acompanhamento de obras, além de outras evoluções em relação à legislação que a antecede. Perceba-se que esses exemplos que dei sobre a obras na nova Lei de Licitações não estavam presentes na Lei nº 8.666/93, e alguns já estavam na Lei do RDC e na Lei das Estatais, porém ainda pouco utilizados.

Com tudo isso, posso afirmar categoricamente que se forem promovidas capacitações aos servidores e se houver compreensão de todos os atores envolvidos em uma contratação de obras e serviços de engenharia, em especial os órgão de controle, a Lei nº 14.133/21 tenderá a trazer frutos muito melhores que os que produzia a já moribunda Lei nº 8.666/93.

Na sua avaliação, entre todos os pormenores constantes na Lei nº 14.133/2021, qual é aquele que deve ter maior atenção por parte da Alta Administração do órgão ao regulamentar e operacionalizar a Nova Lei?

Acredito que a Alta Administração deve se preocupar com a governança do órgão ou entidade pelo qual é responsável, implementando processos mais eficazes, fornecendo estrutura para aqueles que atuam nas licitações e contratações, principalmente um constante aprimoramento por meio de capacitações periódicas e específicas, devendo ainda promover gestão de riscos levando em conta todas as fases do procedimento, desde o ETP até a pós-ocupação. Porém, não podemos esquecer da necessidade de incentivar a inovação e o desenvolvimento nacional sustentável.

A Lei dá a responsabilidade da governança para a Alta Administração, e o mesmo Diploma Legal fornece meios para que seja fomentada a inovação e o desenvolvimento de forma sustentável por meio das mais diversas ferramentas, muitas delas citei na resposta à pergunta anterior.

Diante das valiosas perspectivas compartilhadas pelo Dr. Hamilton Bonatto, fica evidente a importância da nova Lei nº 14.133/2021 nas contratações públicas do Brasil. Suas reflexões destacam a necessidade de adaptação e atenção aos detalhes por parte dos profissionais do Direito Administrativo e da Alta Administração, visando à eficácia, transparência e inovação na gestão de obras públicas. A lei oferece ferramentas para aprimorar a qualidade, rapidez e tecnologia envolvidas nesses processos, e seu sucesso dependerá da capacitação dos servidores e da compreensão de todos os atores envolvidos, bem como do respeito à autonomia dos entes federativos. Portanto, a aplicação da nova legislação promete trazer resultados significativamente melhores do que sua antecessora, promovendo uma mudança positiva na atuação da advocacia pública nos atos licitatórios.

Fique atento para as próximas entrevistas nesta série, nas quais continuaremos a explorar temas relevantes da Administração Pública com os especialistas participantes deste 1º Congresso de Contratações Públicas do Nordeste. Não perca a oportunidade de se manter atualizado sobre as transformações que moldarão o futuro do nosso país.

Para mais informações, siga o meu perfil no Instagram: @fabio.monteirost

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Sobre o blog

Fabio Monteiro é administrador, consultor, instrutor e palestrante. Possui experiência de 10 anos como gestor de licitações e patrimônio público. Graduando em Gestão Pública. Atua na empresa Moura Treinamentos e Desenvolvimento Profissional (Ribeirão Preto/SP). Consultor técnico na empresa Wap Express (Maceió/AL) e Administrador da empresa FMS Office (Ribeirão Preto/SP). Atuou no setor público como Diretor de Compras, Presidente de Comissão de Licitações e Pregoeiro qualificado. Possui artigos publicados em revistas e portais direcionados à capacitação no âmbito das contratações públicas, como a Revista Eletrônica de Licitações e Contratos do INAP (SP), o Portal Solicita e o Portal Migalhas. Pesquisador e idealizador de métodos práticos para aplicação da Lei de Licitações nos órgãos públicos e para capacitação de empresários em contratações governamentais.

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