Verdades fabricadas: o risco da inteligência artificial no Direito

Você já imaginou uma prova sendo forjada por uma inteligência artificial? Um vídeo falso, um áudio editado, um documento inexistente? Pois é. Isso já não é mais ficção científica — é presente. E o Direito, que caminha com passos de chumbo, ainda está tentando entender como lidar com isso.
Com o avanço das tecnologias, especialmente as chamadas IAs generativas, estamos assistindo a uma nova onda de desinformação. Só que agora, em vez de boatos no boca a boca, temos vídeos com rostos e vozes que parecem reais. E se isso já é preocupante nas redes sociais, imagine no processo penal.
A lógica da prova, que é a alma do processo, está sendo ameaçada. A máxima do in dubio pro reo pode ser corroída se o que se apresenta como “prova” é, na verdade, produto de manipulação digital. E o mais grave: muitas vezes essa falsificação é tão bem-feita que até peritos experientes têm dificuldade de identificá-la.
Um caso emblemático ocorreu recentemente no Brasil, onde um vídeo deepfake foi utilizado para tentar incriminar uma pessoa inocente. A manipulação era tão sofisticada que, à primeira vista, parecia autêntica. Somente após uma análise forense detalhada foi possível comprovar a falsificação.
A pergunta que fica é: nosso sistema de Justiça está preparado para isso? Advogados, promotores, magistrados — todos nós precisamos reaprender a lidar com a prova digital. Precisamos criar mecanismos de verificação, protocolos de validação e, principalmente, uma nova postura crítica diante do que nos é apresentado.
A verdade não pode ser terceirizada para uma máquina. E a justiça não pode ser feita com base em ilusões tecnológicas. Porque quando a verdade passa a ser fabricada, o Direito corre o risco de deixar de ser justo.
E se a próxima sentença for baseada em uma mentira digital? Estamos prontos para enfrentar essa realidade?

Sandra Gomes é mãe, mulherista e ativista social. Advogada Criminal, Pós Graduanda em Direito Penal e Processual Penal, Pós Graduanda em Direito Médico. É ex Presidente da Comissão da Igualdade Racial da Abracrim AL e Ex Vice Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/AL.