Collor poderia ter evitado a prisão, mas a teimosia patogênica não permitiu

Não se pode dizer que, dois anos e meses atrás, aos 73 anos de idade, Fernando Collor não tinha como avaliar o risco que corria de ser preso, como cidadão comum, sem prerrogativas, caso ficasse sem a imunidade assegurada por um mandato eletivo exercido no Congresso Nacional.
Com a experiência de quem começou a carreira política como prefeito de Maceió nomeado pelo então governador Guilherme Palmeira, entre 1978 e 1982 (época de eleição indireta dos prefeitos das capitais sob o regime militar), e desde então exerceu os cargos de governador de Alagoas, deputado federal, presidente da República e senador, Collor sabia de tudo.
Economista, não tinha conhecimentos jurídicos, mas poderia se informar recorrendo ao primo Marco Aurélio Mello, advogado, que ele, na presidência da República, nomeou como ministro do Supremo Tribunal Federal. Não o fez e, mesmo sendo quem é, acabou preso e obrigado a cumprir o roteiro imposto a bandidos periculosos: detenção no aeroporto, passagem pelo IML para exame de corpo de delito, identificação perante a polícia, audiência de custódia, até chegar ao presídio.
Não que o processo por corrupção (recebimento de propina, associação criminosa e lavagem de dinheiro) pudesse ser evitado ou simplesmente arquivado depois de instaurado. Mas a ‘imunidade parlamentar’ poderia, sim, tê-lo mantido distante da cela prisional, a salvo, por assim dizer, do constrangimento decorrente da ordem de prisão expedida, em seu caso, pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.
Sucede que Collor, não sendo um político qualquer – seu currículo demonstra isso muito bem – pagou para ver, movido e dominado por uma teimosia indefinível.
Na eleição de 2022, ano em que findava seu mandato de senador, o ex-presidente poderia ter seguido o exemplo do mineiro Aécio Neves (não por acaso também denunciado e processado por corrupção) e buscado um mandato de deputado federal. Com um pouco de humildade, tentaria uma composição com o grupo político do senador Renan Calheiros (é só um exemplo) e, eleito, garantiria na Câmara dos Deputados, a mesma imunidade de que se valia no Senado Federal.
Mas a teimosia (ou o orgulho) falou mais alto e, após avaliar que não teria chance de reeleição enfrentando o governador Renan Filho, decidiu sair candidato ao governo. Erro fatal. Disputavam a sucessão os dois grupos que dominam a política alagoana: de um lado, Renan Calheiros, Paulo Dantas, Ronaldo Lessa, Renan Filho, Marcelo Victor e, de outro, Artur Lira, João Caldas filho e Rodrigo Cunha. Logo, não havia chance para uma ‘terceira via’, quer dizer, para um Fernando Collor isolado, decadente e de mãos vazias. Ficou em terceiro lugar, sequer foi para o segundo turno.
Meses depois, em 2023, sem mandato e, pois, sem prerrogativa de foro, Collor viu seu processo andar. Em maio, foi julgado e condenado pelos ministros do Supremo: 8 anos e 10 meses de prisão em regime fechado. Restava-lhe ganhar tempo com recursos meramente protelatórios – os chamados ‘embargos infringentes’. Trânsito julgado, a pena era definitiva, imutável, e a ordem de prisão passara a ser mera questão de tempo.
Collor sabia, tinha plena consciência da situação: com mandato e imunidade assegurada pelo espaço ocupado no Congresso, seu processo não teria avançado ‘tão rápido’ e, muito menos, servido de ensaio preparatório para, quem sabe, encaminhar à prisão um outro ex-presidente da República...