Ciência, tecnologia e inovação
Nova epidemia de branqueamento ameaça sobrevivência de recifes de corais
Branqueamento é causado pelo aquecimento e acidificação do oceano
As mudanças climáticas estão transformando a Terra. São tempestades, enchentes, deslizamentos de encostas, ondas de calor e queimadas que prejudicam vidas e arrasam cidades. No entanto, para além dos desastres ambientais evidentes, o aquecimento global também desencadeia outras consequências igualmente devastadoras, algumas delas mais conhecidas por cientistas e pesquisadores.
Os recifes de corais, por exemplo, são "vítimas discretas ou silenciosas" desse fenômeno. Uma das principais ameaças é o branqueamento dos corais, processo causado pelo aquecimento e acidificação do oceano. O tecido desses organismos fica translúcido, revelando seu esqueleto e causando a diminuição da capacidade reprodutiva e a redução das taxas de crescimento e de calcificação, o que pode provocar a morte dos corais.
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, os recifes de corais abrigam 25% da fauna marinha, incluindo cerca de 65% dos peixes, muitos deles de espécies comerciais. Ou seja, esses ecossistemas funcionam como condomínios subaquáticos, onde moram diversas espécies de peixes, tartarugas e invertebrados, como caranguejos e moluscos, além de ser fonte de alimento e abrigo para outras espécies que estão de passagem. Um levantamento realizado pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) alerta que, se algo não for feito de maneira urgente, 90% dos recifes de corais podem desaparecer até 2050.
Entretanto, além de vítimas, os recifes de corais também são aliados na luta contra as mudanças climáticas. O recente estudo "Oceano sem Mistérios - Desvendando os recifes de corais", realizado pela Fundação Grupo Boticário, identificou que os corais geram receita de até R$ 167 bilhões ao Brasil em serviços de proteção costeira e turismo.
Ao evitar os efeitos de ressacas e outros eventos climáticos extremos, os recifes protegem a infraestrutura pública e privada da força das ondas, como ruas, calçadas, moradias, comércios e outras construções, evitando também gastos com obras para erguer barreiras artificiais cada vez mais necessárias em regiões costeiras. Segmentos de lazer e recreação do Nordeste chegam a arrecadar R$ 7 bilhões por ano no Brasil nos destinos que contam com recifes de corais.
Infelizmente, a situação desses ecossistemas está se tornando mais grave a cada dia. Em fevereiro deste ano, a temperatura da superfície do oceano foi a mais alta já registrada na história, com média de 21,06ºC, de acordo com o observatório climático europeu Copernicus. A temperatura dos mares em março também deve ficar acima da média histórica e, com isso, o mundo está enfrentando, neste ano, a quarta epidemia de branqueamento de corais, que deve atingir todo o Hemisfério Sul, inclusive o Brasil.
Diante deste cenário tão desafiador, a redução na emissão de gases de efeito estufa, bem como a descarbonização, são urgentes para conter o branqueamento dos corais. No entanto, será necessário atuar também em outras frentes simultâneas e complementares. Soluções inovadoras baseadas na ciência trazem esperança e podem ajudar a natureza a resistir às pressões.
Exemplo dessa contribuição é a Biofábrica de Corais, projeto de uma startup pernambucana que desenvolve atividades de turismo regenerativo, utilizando ferramentas biotecnológicas para a restauração dos recifes, através do cultivo de corais. Outra iniciativa promissora, desenvolvida por pesquisadores da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), é a criação de corais de proveta. A técnica de fecundação in vitro, que acaba de ser desenvolvida com sucesso pela primeira vez no Brasil, pode significar uma chance para repovoar áreas de recifes devastadas.
Essas iniciativas significam uma esperança real para aumentar a resiliência dos recifes de corais. A morte desses organismos pode não impactar diretamente na sua rua, que pode estar a milhares de quilômetros do mar, mas certamente impacta a vida de todos, seja na economia do país, no pescado que não chega mais ao prato ou mesmo na produção de fármacos.