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Cientistas dizem ter encontrado origem do campo magnético do Sol
Novo estudo, publicado na revista Nature, contesta pesquisas anteriores que diziam que o campo magnético do Sol tem origem no interior do corpo celeste
O Sol possui um poderoso campo magnético que cria manchas solares na superfície da estrela e desencadeia tempestades solares, como aquela que banhou grande parte do planeta em belas auroras neste mês.
Mas exatamente como esse campo magnético é gerado dentro do Sol é um quebra-cabeça que tem intrigado astrônomos por séculos, remontando ao tempo do astrônomo italiano Galileu Galilei, que fez as primeiras observações de manchas solares no início dos anos 1600, e notou como elas variavam ao longo do tempo.
Pesquisadores por trás de um estudo interdisciplinar apresentaram uma nova teoria em um relatório publicado na quarta-feira (22) na revista Nature. Ao contrário de pesquisas anteriores que diziam que o campo magnético do Sol tem origem no interior do corpo celeste, eles suspeitam que a fonte esteja muito mais próxima da superfície.
O modelo desenvolvido pela equipe poderia ajudar os cientistas a entender melhor o ciclo solar de 11 anos e melhorar a previsão do tempo espacial, que pode interromper o GPS e os satélites de comunicação, além de encantar os observadores do céu noturno com auroras.
“Este trabalho propõe uma nova hipótese sobre como o campo magnético do Sol é gerado, que se ajusta melhor às observações solares e, esperamos, poderia ser usada para fazer previsões mais precisas da atividade solar,” disse Daniel Lecoanet, professor assistente de ciências de engenharia e matemática aplicada na McCormick School of Engineering da Northwestern University e membro do Center for Interdisciplinary Exploration and Research in Astrophysics.
“Queremos prever se o próximo ciclo solar será particularmente forte ou talvez mais fraco do que o normal. Os modelos anteriores (assumindo que o campo magnético solar é gerado no interior do Sol) não foram capazes de fazer previsões precisas ou (determinar) se o próximo ciclo solar será forte ou fraco,” acrescentou.
As manchas solares ajudam os cientistas a rastrear a atividade solar. Elas são o ponto de origem para as explosivas erupções e eventos de ejeção que liberam luz, material solar e energia no espaço. A recente tempestade solar é evidência de que o Sol está se aproximando do “máximo solar” — o ponto em seu ciclo de 11 anos em que há o maior número de manchas solares.
“Porque achamos que o número de manchas solares acompanha a força do campo magnético dentro do Sol, pensamos que o ciclo de 11 anos de manchas solares está refletindo um ciclo na força do campo magnético interno do Sol,” disse Lecoanet.
Modelando o campo magnético do Sol
É difícil ver as linhas do campo magnético do sol, que se curvam através da atmosfera solar para formar uma teia complicada de estruturas magnéticas muito mais complexas do que o campo magnético da Terra. Para entender melhor como o campo magnético do Sol funciona, os cientistas recorrem a modelos matemáticos.
O modelo que Lecoanet e seus colegas desenvolveram levou em conta um fenômeno chamado oscilação torcional — fluxos magneticamente impulsionados de gás e plasma dentro e ao redor do Sol que contribuem para a formação de manchas solares.
Em algumas áreas, a rotação desse recurso solar acelera ou desacelera, enquanto em outras permanece constante. Assim como o ciclo magnético solar de 11 anos, as oscilações torcionais também experimentam um ciclo de 11 anos.
“Observações solares nos deram uma boa ideia de como o material se move dentro do Sol. Para nossos cálculos em supercomputação, resolvemos equações para determinar como o campo magnético muda dentro do Sol devido aos movimentos observados,” disse Lecoanet.
“Ninguém tinha feito esse cálculo antes porque ninguém sabia como executar o cálculo de forma eficiente,” acrescentou.
Os cálculos do grupo mostraram que os campos magnéticos podem ser gerados a cerca de 20.000 milhas (32.100 quilômetros) abaixo da superfície do Sol — muito mais perto da superfície do que se assumia anteriormente. Outros modelos haviam sugerido que era muito mais profundo — cerca de 130.000 milhas (209.200 quilômetros).
“Nossa nova hipótese fornece uma explicação natural para as oscilações torcionais que estão faltando nos modelos anteriores,” disse Lecoanet.
Enigma astrofísico
Um avanço importante foi o desenvolvimento de novos algoritmos numéricos para executar os cálculos, disse Lecoanet. O autor principal do artigo, Geoff Vasil, professor da Universidade de Edimburgo, no Reino Unido, teve a ideia há cerca de 20 anos, disse Lecoanet, mas levou mais de 10 anos para desenvolver os algoritmos e foi necessário um supercomputador da Nasa (agência espacial dos Estados Unidos) poderoso para conduzir as simulações.
“Usamos cerca de 15 milhões de horas de CPU para esta investigação,” disse ele. “Isso significa que se eu tivesse tentado executar os cálculos no meu laptop, teria levado cerca de 450 anos.”
Num comentário publicado junto ao estudo, Ellen Zweibel, professora de astronomia e física da Universidade de Wisconsin-Madison, disse que os resultados iniciais eram intrigantes e ajudariam a informar modelos e pesquisas futuras. Ela não esteve envolvida no estudo.
Zweibel disse que a equipe adicionou “um ingrediente provocador à mistura teórica que poderia ser fundamental para desvendar esse enigma astrofísico.”