Economia
Latam tenta obter crédito do BNDES para evitar piora da crise
Matriz da empresa, no Chile, entrou com pedido de recuperação nos EUA, mas deixou operação brasileira de fora
A direção da Latam vai tentar de tudo para convencer o governo brasileiro que tem condições de receber o financiamento que o BNDES está disposto a oferecer para as companhias aéreas enfrentarem a crise gerada pelo novo coronavírus.
A empresa depende de um reforço de caixa para honrar gastos correntes no país, segundo fontes do setor ouvidas pelo GLOBO. O crédito do banco estatal, neste caso, é fundamental para impedir o agravamento da crise e evitar que a empresa precise recorrer a uma recuperação judicial no Brasil.
Ontem, a matriz chilena — que concentra as dívidas financeiras e os contratos de arrendamento de aviões — entrou com pedido de proteção judicial nos EUA, que se estende para as subsidiárias no Peru, Colômbia, Equador, mas não inclui o Brasil.
A empresa já levantou US$ 900 milhões com seus principais acionistas e busca assegurar mais US$ 400 milhões.
— As empresas conseguiram reduzir salários e mais prazo com os credores. Por enquanto Infraero, lessor (arrendador de aeronaves) e outros fornecedores não estão cobrando — diz um executivo do setor, alertando que depois, quando voltar a ser cobrada, a empresa teria dificuldade para pagar.
Aval do setor privado
A empresa vinha travando negociações difíceis com o BNDES para um aporte de até R$ 2 bilhões. Agora sob a possível proteção da lei americana, a empresa tenta convencer o banco a aderir, nos EUA, a uma modalidade de financiamento que dá ao credor a preferência no recebimento dos pagamentos, o chamado financiamento DIP.
O BNDES, que também negocia com Azul e Gol, impôs como condição para conceder o empréstimo que as empresas tenham ação negociada na Bolsa de valores brasileira, e que o plano seja validado pelo setor privado, com 30% dos R$ 2 bilhões sendo levantados no mercado financeiro.
A primeira condição a Latam não atende. Suas ações são listadas na Bolsa de Santiago, além de recibos (ADRs) negociados em Nova York.
Mas em entrevista à GloboNews ontem, o presidente da Latam no Brasil, Jerome Cadier, defendeu que metade do compromisso de US$ 900 milhões do financiamento DIP seja levado em conta pelo BNDES como uma validação do plano de negócios da companhia.
— Tem uma preocupação do BNDES, louvável e compreensível, que não seja só o governo colocando dinheiro, como tem acontecido em alguns países. E neste momento a Latam consegue atender exatamente essa questão porque se o BNDES solicitava que pelo menos R$ 600 milhões fossem colocados pelo mercado, a Latam tem, desde ontem US$ 900 milhões, que irão para o grupo todo. Se a Latam Brasil representa metade, são US$ 450 milhões que vão fluir do mercado para financiar a Latam, além dos governos — disse.
Ajuste de pessoal
A empresa tenta evitar ao máximo a recuperação judicial no Brasil porque a legislação local impõe uma série de restrições que dificultam a sobrevivência das companhias. Nos EUA, o chamado Capítulo 11 da lei de falências já foi usado diversas vezes pelas empresas aéreas, que saíram fortalecidas do processo.
A Latam também tenta convencer o governo do Chile, cujo presidente, Sebastian Piñera, é ex-acionista da companhia, a entrar no pool de financiamento.
O governo chileno ainda não se comprometeu com nenhuma ajuda financeira, mas depois do tombo das ações da empresa, o ministro da Fazenda, Ignacio Briones, afirmou que existem diversos elementos objetivos para declarar a Latam uma “empresa estratégica”, o que pode abrir as portas para a ajuda.
A Latam inicia na semana que vem uma negociação com o Sindicato Nacional dos Aeronautas. Em reunião ontem, a empresa afirmou ter um “excedente de tripulantes”. Segundo o presidente do SNA, Ondina Dutra, a empresa estaria “disposta a negociar um plano para evitar demissões”.
Cadier já reconheceu que a estrutura da companhia será ajustada diante da queda brusca da demanda.
O Procon-SP pediu explicações à Latam sobre os impactos do pedido de proteção. Em nota, a empresa disse que o consumidor não será afetado.
A Air France-KLM, Iberia Lineas Aereas, Copa Airlines, Air Europa, Alitalia e TAP Air Portugal também foram notificadas pelo Ministério da Justiça para explicarem como estão fazendo com a remarcação de passagens e a devolução de valores aos consumidores.