Economia

Latam tenta obter crédito do BNDES para evitar piora da crise

Matriz da empresa, no Chile, entrou com pedido de recuperação nos EUA, mas deixou operação brasileira de fora

Por O Globo 28/05/2020 08h08

A direção da Latam vai tentar de tudo para convencer o governo brasileiro que tem condições de receber o financiamento que o BNDES está disposto a oferecer para as companhias aéreas enfrentarem a crise gerada pelo novo coronavírus.

A empresa depende de um reforço de caixa para honrar gastos correntes no país, segundo fontes do setor ouvidas pelo GLOBO. O crédito do banco estatal, neste caso, é fundamental para impedir o agravamento da crise e evitar que a empresa precise recorrer a uma recuperação judicial no Brasil.

Ontem, a matriz chilena — que concentra as dívidas financeiras e os contratos de arrendamento de aviões — entrou com pedido de proteção judicial nos EUA, que se estende para as subsidiárias no Peru, Colômbia, Equador, mas não inclui o Brasil.

A empresa já levantou US$ 900 milhões com seus principais acionistas e busca assegurar mais US$ 400 milhões.

— As empresas conseguiram reduzir salários e mais prazo com os credores. Por enquanto Infraero, lessor (arrendador de aeronaves) e outros fornecedores não estão cobrando — diz um executivo do setor, alertando que depois, quando voltar a ser cobrada, a empresa teria dificuldade para pagar.

Aval do setor privado

A empresa vinha travando negociações difíceis com o BNDES para um aporte de até R$ 2 bilhões. Agora sob a possível proteção da lei americana, a empresa tenta convencer o banco a aderir, nos EUA, a uma modalidade de financiamento que dá ao credor a preferência no recebimento dos pagamentos, o chamado financiamento DIP.

O BNDES, que também negocia com Azul e Gol, impôs como condição para conceder o empréstimo que as empresas tenham ação negociada na Bolsa de valores brasileira, e que o plano seja validado pelo setor privado, com 30% dos R$ 2 bilhões sendo levantados no mercado financeiro.

A primeira condição a Latam não atende. Suas ações são listadas na Bolsa de Santiago, além de recibos (ADRs) negociados em Nova York.

Mas em entrevista à GloboNews ontem, o presidente da Latam no Brasil, Jerome Cadier, defendeu que metade do compromisso de US$ 900 milhões do financiamento DIP seja levado em conta pelo BNDES como uma validação do plano de negócios da companhia.

— Tem uma preocupação do BNDES, louvável e compreensível, que não seja só o governo colocando dinheiro, como tem acontecido em alguns países. E neste momento a Latam consegue atender exatamente essa questão porque se o BNDES solicitava que pelo menos R$ 600 milhões fossem colocados pelo mercado, a Latam tem, desde ontem US$ 900 milhões, que irão para o grupo todo. Se a Latam Brasil representa metade, são US$ 450 milhões que vão fluir do mercado para financiar a Latam, além dos governos — disse.

Ajuste de pessoal

A empresa tenta evitar ao máximo a recuperação judicial no Brasil porque a legislação local impõe uma série de restrições que dificultam a sobrevivência das companhias. Nos EUA, o chamado Capítulo 11 da lei de falências já foi usado diversas vezes pelas empresas aéreas, que saíram fortalecidas do processo.

A Latam também tenta convencer o governo do Chile, cujo presidente, Sebastian Piñera, é ex-acionista da companhia, a entrar no pool de financiamento.

O governo chileno ainda não se comprometeu com nenhuma ajuda financeira, mas depois do tombo das ações da empresa, o ministro da Fazenda, Ignacio Briones, afirmou que existem diversos elementos objetivos para declarar a Latam uma “empresa estratégica”, o que pode abrir as portas para a ajuda.

A Latam inicia na semana que vem uma negociação com o Sindicato Nacional dos Aeronautas. Em reunião ontem, a empresa afirmou ter um “excedente de tripulantes”. Segundo o presidente do SNA, Ondina Dutra, a empresa estaria “disposta a negociar um plano para evitar demissões”.

Cadier já reconheceu que a estrutura da companhia será ajustada diante da queda brusca da demanda.

 

O Procon-SP pediu explicações à Latam sobre os impactos do pedido de proteção. Em nota, a empresa disse que o consumidor não será afetado.

A Air France-KLM, Iberia Lineas Aereas, Copa Airlines, Air Europa, Alitalia e TAP Air Portugal também foram notificadas pelo Ministério da Justiça para explicarem como estão fazendo com a remarcação de passagens e a devolução de valores aos consumidores.