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Turbantes na cadeia da moda cultural em Alagoas
Tem turbante para todos estilos e gostos, é o que revela há três anos a produção talentosa de Tereza Olegário, militante do Movimento Negro e do Movimento Comunitário em Alagoas. Ela chegou a Maceió em 2005, vindo da Comunidade da Rocinha, no Rio de Janeiro, ainda adolescente, mas já trazendo consigo toda a simbologia negra na teoria e na prática. Pesquisadora em Direitos Humanos, define o turbante como a compreensão do processo de empoderamento na forma da resistência, sabedoria, política e elegância. Ex-coordenadora da Igualdade Racial de Maceió, ela nos conta que até os nós e amarrações de turbantes têm um significado, e que moda+cultura se misturam num resultado de beleza e de história, de luta e de conquistas. “Para nós brasileiras, herdeiras da cultura afro, o turbante significa o símbolo da nossa história, de resistência à escravidão; das nossas crenças e principalmente da valorização da nossa beleza e cultura, tão negada e muitas vezes invisibilizadas para não atribuir veracidade ao que a história e a atual conjuntura mostram sobre ela”, define Tereza.
Painel Alagoas - Como é trabalhar numa arte que traz em si uma cultura histórica? O que, além de cores e talento, carrega seus turbantes e acessórios?
Tereza Olegário – É muito gratificante trabalhar na confecção de turbantes. Eles destacam a simbologia de uma cultura riquíssima e, atualmente, é uma tendência da moda, porém muita gente acaba esquecendo o seu real significado cultural. É muito utilizado pelos étnicos, com inspiração em culturas e costumes de povos e regiões. É interessante lembrar que o turbante tem origem na África e Oriente. Historicamente, esse símbolo traz os sentidos e importâncias relacionadas à cada cultura do Continente Africano. Já que, em cada país ou tribo, ele possui um significado, em virtude das características que formam cada cultura.
Painel Alagoas – O que significa os nós e amarrações dos turbantes?
TO - Os nós e amarrações possuem uma imensidade de significados dependendo da região e costumes das tribos. Alguns países da África chamam o turbante de gelê, outros de Ojá, e se configura em um dos hábitos de vestuários da tradição, com uso unissex, fazendo parte de atos religiosos e da moda africana. Traz sentidos fortíssimos para os povos africanos em relação a proteção da cabeça, como um símbolo de fé na divindade e em pensamentos, bem como um acessório moderno. Na cultura afro-brasileira, simboliza a resistência relacionada a aculturamentos, identidades e uma luta em combate ao preconceito. Por isso, é importante que se compreenda a origem dos turbantes, que não é apenas um acessório, mas que carrega, em si, diversos fatos de importância para a cultura afro. O Turbante é, antes de qualquer coisa, uma maneira de expressão e comunicação, símbolo de resistência, pois esbanjam identidade, empoderamento e muita autoestima.
Painel Alagoas – Há quanto tempo você confecciona turbantes? Como nasceu essa ideia?
TO – Há 3 anos que me dedico a confeccionar turbantes e à realização de Oficinas de empoderamento das mulheres através desse tema. Na verdade, tudo começou através da minha aproximação com a Deputada Federal Tereza Nelma, com a oportunidade que ela me deu de trabalhar como coordenadora da igualdade racial no município de Maceió, período em que pude me aproximar do movimento negro e a partir daí minha visão de ser mulher e de mundo mudou. Eu fui me reconhecendo como mulher negra e resgatei minhas origens. Percebi que o turbante, que tanto gosto, poderia cair no gosto de outras pessoas, sobretudo das mulheres. Mulheres que usam turbantes para se empoderar, mulheres que usam turbantes como um ato político, de resistência. A partir de então, fui vendo a necessidade de confeccionar os turbantes a preços acessíveis e daí surgiu a Olegário Turbantes, que não tem ajudado apenas a mim reconhecer, mas também outras mulheres se reconhecerem.
Painel Alagoas - As pessoas compram facilmente turbantes? Elas entendem que essa é uma criação cultural ou veem isso como uma questão de moda?
TO – Os turbantes são fáceis de vender, sim. A maioria das pessoas é atraída pela beleza, pela moda atual, então eu explico toda simbologia que esse objeto carrega e ao final, as pessoas saem com um produto que traz em si um aspecto cultural de grande valor para história étnica do povo brasileiro. Por ter suas raízes na África, as pessoas pensam que o Turbante é apenas para negros. Convém destacar que nossa etnia é fruta da miscigenação e, portanto, o povo brasileiro precisa adquirir o hábito de usá-lo. O Turbante é referência da ancestralidade e da identidade afro-brasileira. O acessório traz as características de: cores vibrantes, texturas diferenciadas, estampas com símbolos que fazem referências religiosas e tribais e formatos marcantes nas amarrações.
Painel Alagoas – Há no Brasil e em Alagoas um mercado para produtos como esses que você faz? Algum tipo de incentivo por parte do poder público?
TO - O turbante é uma indumentária usada em várias culturas no mundo, mas no Brasil ela ganha destaque através dos negros africanos, resgatado pelo uso das baianas, como parte integrante do seu traje, remetendo ao respeito às ancestralidades. Para nós brasileiras, herdeiras da cultura afro, o turbante significa o símbolo da nossa história, de resistência à escravidão; das nossas crenças e principalmente da valorização da nossa beleza e cultura, tão negada e muitas vezes invisibilizadas para não atribuir veracidade ao que a história e a atual conjuntura mostram sobre elas. O Estado da Bahia é o local onde o Turbante é mais usado no Brasil. Em Alagoas o uso ainda é pequeno, mas as pessoas estão aprendendo a conviver com ele.
Painel Alagoas – Quanto custa um turbante em média, é cara a matéria-prima? Como você escolhe os tecidos, as cores, as estampas? Há uma regra nessa confecção? Há algum tipo de que você gosta mais de fazer?
TO – Depende do tecido. Tenho muitas clientes que são da periferia, então, tento deixar em um preço acessível, porque sei o quanto isso pesa no bolso. Sempre escolho tecidos africanos e tecidos mais simples, cores lisas, e estampas que retratem à cultura afro brasileira. A medida de largura é a partir de 30 cm e 2 metros de comprimento. O que eu gosto mais de confeccionar são os turbantes com motivos africanos, eles deixam as amarrações bem mais fixo e charmoso.
Painel Alagoas - Há turbantes para todas as ocasiões? É possível ir a uma solenidade cívica ou a um casamento usando turbante? Que tipo seria apropriado para uma festa solene ou de luxo?
TO – Sim. Os turbantes podem e devem ser usados em qualquer ocasião. Trata-se de um acessório composto por faixa longa de tecido que deve ser envolto e amarrado de modos diferentes na cabeça. É um artigo para todo o momento. É possível utilizar o turbante naqueles dias que achar que o cabelo não acordou de acordo com o seu gosto ou quem passa por transição capilar. Mas é possível fazer uso do turbante no momento em que quiser e considerar perfeito. O que faz a diferença para ocasião são o formato, o tipo de amarração e o tipo de tecido. Há combinações que são excelentes para o cotidiano e ambientes casuais e outras para festividades e ambientes sofisticados. Por exemplo: tecidos brocados ou com brilho pedem ocasiões especiais. É possível fazer a cobertura do cabelo inteiro com o turbante ou fazer a amarração como um jeito de valorizar os fios. As alternativas são diversas!
Painel Alagoas – Em Alagoas existe algum grupo, ou uma associação, uma cooperativa que acolha artesãos como você, com produtos que remetam à alguma cultura, sobretudo a cultura afro?
TO – Específico para turbantes não, mas não estou mais na invisibilidade. Hoje já sou convidada para eventos, feiras, exposições e algumas Organizações da Sociedade Civil já reconhecem o meu trabalho.
Painel Alagoas – Alagoanas gostam de turbante? Qual a média da tua produção por mês? Você tem algum projeto, algum sonho, de tornar essa tua marca um produto comercial mais forte no mercado? Quantas pessoas trabalham contigo?
TO – O uso do Turbante em Alagoas é muito pequeno, mas aos poucos estamos começando a quebrar essa barreira. Minha produção depende muito dos eventos que participo, como ainda não tenho minha loja física (que pretendo ter) procuro sempre participar de feiras artesanais ou quando sou convidada para algum evento. Sempre tenho atividades com a Olegário Turbantes, então não paro minha produção. Além disso, tenho minhas redes sociais, que facilita muito o atendimento às clientes. O trabalho é realizado por mim, mas tenho apoio do meu noivo e da minha família, que estão sempre me ajudando no transporte e organização do material.