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Em Paris, dream team do futebol de cegos sonha com sexto ouro seguido

Com os dez jogadores patrocinados pelo Bolsa Atleta, equipe é dona de todos os títulos da história da modalidade em Jogos Paralímpicos e chega à França para manter a hegemonia

Por Redação 22/08/2024 09h09
Em Paris, dream team do futebol de cegos sonha com sexto ouro seguido
Os dez integrantes da seleção brasileira de futebol de cegos já na fase e aclimatação na França - Foto: Reprodução

O paranaense Nilson Silva não tinha como saber, mas quando estufou as redes do goleiro sul-coreano aos 24 minutos daquele 18 de setembro de 2004, na estreia da seleção brasileira de futebol de cegos nos Jogos de Atenas, sua jogada significou bem mais do que o primeiro gol na história do futebol de cegos em Paralimpíadas.

O lance abriu portas para a maior dinastia do Brasil em qualquer modalidade. A goleada por 4 x 0 foi o início da campanha em Atenas que levou a seleção ao ouro após triunfo sobre a Argentina nos pênaltis na decisão. O título foi apenas o primeiro de um time que, até hoje, é imbatível na modalidade em Jogos Paralímpicos.

Depois de vencer em 2004, o Brasil repetiu o ouro em Pequim 2008, Londres 2012, Rio 2016 e Tóquio 2021. Chega aos Jogos Paralímpicos de Paris 2024 disposto a manter o status de dream team e, pela sexta vez seguida, conquistar a medalha dourada. Os Jogos Paralímpicos serão de 28 de agosto a 8 de setembro.

“A seleção está muito bem preparada. A gente sabe que tem adversários à altura, mas vamos esperar fazer uma grande competição e, quem sabe, levar um ouro para o nosso país”, diz o técnico Fábio Vasconcelos. Ele fala com a experiência de quem esteve presente nos cinco ouros: três vezes como goleiro (Atenas 2004, Pequim 2008 e Londres 2012) e duas como treinador (Rio 2016 e Tóquio 2021).

“Tem um grupo aí experiente, que já ganhou duas, três, quatro medalhas. Eu tenho a felicidade de estar nas cinco. Estou indo para a terceira como treinador, mas é o que falo: não dá para viver do passado. A gente ganhou as cinco, mas não teve uma delas que foi fácil. Essa não vai ser diferente. Todo mundo quer ganhar do Brasil, tirar a hegemonia, mas a gente teve uma preparação muito boa”, explica Fábio Vasconcelos.

A modalidade


• No futebol de cegos, cada time é formado por cinco jogadores – um goleiro e quatro na linha.

• Os jogadores usam venda nos olhos e, se tocarem nela, cometem falta.

• Com cinco infrações, o atleta é eliminado do jogo e pode ser substituído.

• Apenas o goleiro tem visão total e atua numa área restrita.

• A bola tem guizos internos para que os atletas consigam localizá-la pelo barulho.

• A torcida só se manifesta na hora do gol e nos intervalos.

• Os atletas contam com três referências: (o goleiro, o técnico e o chamador).

• O chamador fica atrás do gol rival. Ele sinaliza onde os jogadores devem se posicionar e quando e para onde devem chutar.

• Quando há uma falta, ele bate com um objeto metálico nos dois lados da trave e no travessão para o atacante saber onde acertar.

Estreia contra a Turquia

A seleção estreia no futebol de cegos no dia 1º de setembro, às 8h30 (de Brasília), contra a Turquia. Aos 34 anos, Jefinho é um dos mais experientes do elenco e, em Paris, disputará a quinta edição dos Jogos. Para ele, que foi eleito o melhor jogador do mundo em 2010, a Turquia tem um time que pode complicar.

“A gente tem um histórico de jogos contra a Turquia, até em Paralimpíadas mesmo. Enfrentamos eles em 2012 (Londres), em 2016, no Rio, também. Eles voltam agora à competição. É uma seleção europeia que se prepara bem taticamente. Eles têm um esquema de jogo só deles. É um futebol mais lento, porém tem jogadores de habilidade. Se a gente vacilar, eles tornam o jogo muito difícil”, alerta.

Em Paris, os jogadores experimentarão, pela primeira vez em Paralimpíadas, as novas regras do futebol de cegos, que passaram a ser disputados em jogos mais curtos. Para Ricardinho, 35 anos e eleito em três ocasiões o melhor do mundo (2006, 2014 e 2018), as novas regras não favorecem o estilo da seleção brasileira.

“Nós vamos jogar com dois tempos de 15 minutos cronometrados. Antes eram dois de 20. Então, a gente perdeu aí, dos 40, 10 minutos. É bastante. Com certeza atrapalha demais os times técnicos, que querem jogar a bola, que é a marca do nosso time. Só que a gente não pode ficar lamentando. Vamos tentar superar essa adversidade e, se Deus quiser, vamos levar para casa uma medalha de ouro”, analisa o craque, que conquistou o ouro em Pequim 2008, Londres 2012, Rio 2016 e Tóquio 2021.

Nesta quarta-feira (21/8), o time fez o primeiro treino na cidade de Troyes, a cerca de 210 quilômetros de Paris, onde a equipe treinará e fará a aclimatação antes de chegar à capital francesa. Para o técnico Fábio Vasconcelos, o trabalho finaliza uma preparação marcada por entrega e sucesso no processo.

“Foi um ano diferente. Era um sonho que a gente tinha de ter uma seleção permanente. O pessoal se apresentou no fim de janeiro. Começo de fevereiro começaram a treinar todos os dias com bola, de segunda a sábado. Tem a praia também para fazer um trabalho. As famílias foram para lá. Os jogadores estão felizes. Então, foi um ano bem interessante, diferente. Os jogadores estão bem preparados”, frisa o treinador.

As partidas em Paris serão no Eiffel Tower Stadium, tendo ao fundo o mesmo cenário dos jogos do vôlei de praia nas Olimpíadas: um dos cartões postais mais famosos do planeta e um dos símbolos da capital francesa. “A gente estava até comentando. É um cenário perfeito, maravilhoso para a nossa modalidade. A Torre Eiffel é um símbolo mundial, uma das maravilhas do mundo. E vai ser muito bom representar o Brasil, jogar o nosso futebol, num cenário como aquele”, anima-se Jefinho.

O presidente do Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), Mizael Conrado, não esconde o otimismo. E ele fala com conhecimento de causa, já que, como atleta, participou das conquistas dos dois primeiros ouros do Brasil, em Atenas 2004 e Pequim 2008, além de ter sido eleito, em 1998, o melhor jogador do mundo.

“A seleção chega muito bem. Temos alguns dos melhores jogadores do mundo, temos a melhor comissão técnica, um grande trabalho, pensado com toda a estratégia, de modo que os atletas chegassem aqui com as melhores condições possíveis”, avalia.

Todos os jogadores da Seleção de futebol de cegos são integrantes do Bolsa Atleta, o programa de patrocínio direto do Governo Federal. Os dez integrantes recebem apoio do programa do Ministério do Esporte. Dos 280 atletas brasileiros em Paris, 274 são integrantes do Bolsa Atleta (97,8%).0

Dos seis que não fazem parte atualmente, quatro já estiveram em editais anteriores. Os outros dois são guias, que correm ao lado de atletas com deficiência visual. O primeiro edital do Bolsa Atleta em que atletas-guia puderam ser contemplados foi o de dezembro de 2023, após a aprovação da Lei Geral do Esporte.

O Brasil tem 373 medalhas conquistadas em Jogos Paralímpicos, em 11 edições. São 109 ouros, 132 pratas e 132 bronzes. As três modalidades que mais garantiram pódios ao país são atletismo (170 medalhas – 48 ouros, 70 pratas e 52 bronzes), natação (125 medalhas – 40 ouros, 39 pratas e 46 bronzes) e judô (25 medalhas – cinco ouros, nove pratas e 11 bronzes).

A melhor campanha do país nos Jogos foi na última edição, em Tóquio 2020, ocasião em que o país ficou na sétima posição, com 22 ouros, 20 pratas e 30 bronzes – 72 medalhas no total.

*Com Agência GOV