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OAB-AL rebate Seris sobre casos de tortura nos presídios alagoanos

Entidade contesta informação divulgada pela Secretaria de que unidades prisionais não registraram casos de tortura entre janeiro de 2021 e julho de 2022

Por Isabelle Guedes* e Vinícius Rocha 26/01/2023 12h12 - Atualizado em 26/01/2023 15h03
OAB-AL rebate Seris sobre casos de tortura nos presídios alagoanos
Advogado Roberto Moura - Foto: Ascom OAB-AL

O presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH) da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Alagoas, Roberto Moura, rebateu a informação divulgada pela Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social (Seris) que presídios no estado não registraram casos de tortura entre janeiro de 2021 e julho de 2022.

Os dados apresentados pela Seris são de um balanço feito pela Pastoral Carcerária no relatório Vozes e Dados da Tortura em Tempos de Encarceramento em Massa, divulgado em 17 de janeiro. No documento, que analisa dos presídios brasileiros, consta que os estados de Alagoas, Acre e Rio Grande do Norte foram os únicos estados em que não houve denúncias formais de tortura.

Roberto Moura explica que ‘’o relatório da pastoral carcerária é feito a partir de denúncias que são enviadas para a Pastoral Carcerária Nacional através de e-mail ou protocolo no próprio órgão. Ou seja, não há registro de tortura, porque não foram encaminhadas denúncias para a Pastoral Carcerária Nacional, e isso em nada condiz com a realidade, não há respaldo metodológico possível. ‘’

Ele conclui que não é pelo fato de que a Pastoral Carcerária Nacional não recebeu denúncias sobre o tema em Alagoas, que não existe, de fato, tortura no sistema prisional alagoano.

A CDDH apresentou ao Jornal de Alagoas documentos, imagens e relatos de casos em que presidiários e reeducandos foram torturados ou sofreram maus-tratos durante o período em questão. O material foi coletado durante visitas de advogados alagoanos nos presídios do estado.

Segundo Moura, ao menos cinco casos de agressões ocorridas em presídios alagoanos foram registrados pela OAB-AL, em documentos oficiais e notícias divulgadas pela imprensa.

O primeiro, ocorrido em janeiro de 2021, tratou do caso de travestis no presídio Baldomero Cavalcanti, que sofreram assédio e abuso e tiveram que manter relações sexuais com outros reeducandos para ter acesso a itens de higiene básica.

Ainda em 2021, no mês de maio, um idoso de 62 anos foi torturado em Presídio de Segurança Máxima (PSM 1), e outro no Núcleo Ressocializador da Capital e no PSM 2.

Tortura em presídio de AL (Foto:OAB-AL)

Em maio de 2022, um reeducando recebeu disparos de elastômero (balas de borracha) nas nádegas. No mês de setembro, no Presídio do Agreste houve disparo de elastômero em reeducando sem justa causa, considerando, para a OAB, que o reeducando não apresentava riscos para terceiros e nem para si.


Tortura em presídio de AL (Foto:OAB-AL)

No relatório dos anos de 2021 e 2022, são totalizados 23 óbitos em penitenciárias alagoanas, sendo 7 mortes violentas e em 2022, 4 mortes por causa indeterminada. Em 2021, não constam óbitos por causa indeterminada.

Roberto Moura afirma que os presídios alagoanos estão longe de zerar as práticas de tortura, violência e agressão. ''Na verdade, a assessoria da Seris faz o uso do que chamamos na criminologia de cifras ocultas da criminalidade'', fala.

‘’Enfim, é bastante oportunista a tentativa de suscitar que não houve tortura, ainda mais isso sendo utilizado pelo estado de Alagoas como propaganda de uma suposta boa prática do sistema prisional, quando na verdade é o inverso, isso de maneira consubstanciada pelo próprio Grupo de Monitoramento e Fiscalização do TJ/AL”, completa.


Moura apresentou também um trecho de um documento do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ-AL), comandado pelo desembargador Celyrio Adamastor, em que apresenta uma demanda em sub examine sobre denúncia de tortura e de questões ligadas a mortes de pessoas custodiadas pelo Estado, “fatos que se confirmados configuram crimes gravíssimos”, diz o documento.

Documento apresentado pela OAB mostra investigação de relatos de tortura por comissão TJ (Foto: Cortesia)


Segundo o advogado, o estado necessita implementar, de forma definitiva, o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, que seria, para ele, o órgão convencional que acompanha as práticas de tortura através de peritos especializados. “A ausência deste mecanismo gera uma imensa lacuna no acompanhamento de práticas de tortura no sistema prisional e nos espaços de privação de liberdade'', reforça Moura.

Prerrogativas violadas

Em novembro de 2022, Roberto de Moura, juntamente de outros membros da Comissão, foram impedidos, pelo diretor do Presídio do Agreste Rodrigo de Lima, de adentrar na unidade e tratar de assuntos referentes a clientes que cumprem pena na unidade. Na situação, os advogados apuravam denúncias de maus-tratos e sofreram, ainda, ameaças e injúrias.

O diretor da unidade foi indiciado  pelo crime de ameaça caracterizado no Art. 147 do Código Penal e pelo crime de ofensa pessoal contra honra, de acordo com os artigos 138,139, 140 também do código penal.

Em relatório recente, o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), apontou uma série de irregularidades no presídio do agreste, dentre elas, relatos de castigos e maus-tratos aplicados aos reeducandos, que variam desde ficar mais de 45 dias sem direito a banho de sol a beber água apenas durante as refeições.

*Estagiária sob supervisão