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Alagoanas denunciam deformação e mutilação após erro médico em cirurgias plásticas

Elas entraram com uma ação coletiva contra o médico de uma clínica particular em Maceió; cirurgião alega não haver laudo que corrobore erro médico

Por Vinícius Rocha 18/04/2023 11h11 - Atualizado em 18/04/2023 17h05
Alagoanas denunciam deformação e mutilação após erro médico em cirurgias plásticas
Mulheres alegam ter tido seios deformados e corpo mutilados durante cirurgias plásticas em Maceió - Foto: Divulgação

Um grupo de 15 mulheres alagoanas se uniu para denunciar supostos erros médicos em procedimentos estéticos realizado por um cirurgião plástico que atua em Maceió e que teriam causados deformações e até mesmo mutilações em seus corpos. Nesta segunda-feira (17), a Associação AME protocolou, uma denúncia coletiva contra o médico.

Ao Jornal de Alagoas, uma das vítimas do procedimento, Renata Pessoa*, contou que procurou a clínica particular do médico, localizada em um shopping da capital alagoana, para realizar uma cirurgia de mamoplastia de aumento (implantação de prótese de silicone), porém, dias após o procedimento percebeu que seus seios estavam em posições diferentes. 

Entre a procura pelo médico e a cirurgia passaram-se apenas três dias úteis. Segundo ela, o médico não realizou anamnese, procedimento básico em casos operatórios, para saber o histórico de saúde do paciente. O caso não parou por aí e, após a colocação do silicone, ela teria sido convencida pelo médico a fazer outros procedimentos como lipo LAD HD, mini abdominoplastia e enxerto de gordura no glúteo. Ele ofereceu descontos e vantagens caso a paciente realizasse todos os procedimentos. 

Para as outras cirurgias, o médico teria solicitado apenas um exame cardiológico. 

Ela alega que o cirurgião plástico teria dito que ela possuía diástase abdominal, ou seja, os músculos do abdômen separados, e os outros procedimentos corrigiriam o leve problema. Para realizar a mini abdominoplastia é necessária a realização de um exame em específico, fato este não informado pelo médico, que teria exigido apenas um exame cardiológico e mesmo assim seguido com o procedimento. 

Renata relata que dias após o procedimento já era possível detectar diversas falhas na cirurgia, como diferentes tamanhos dos seios e glúteos, a qual o médico apenas minimizava o problema e dizia para que ela usasse as faixas cirúrgicas. "Ele mandava colocar faixa, colocar o rolinho por baixo... Comecei a dizer a ele que não estava satisfeita, comentava que algo estava inchado, precisei contratar uma enfermeira só para mim, meu ponto abriu, minha barriga abriu, cabia uma mão dentro", relatou a paciente. 

Paciente relata não ter tido assistência no pós-operatório e pontos abriram

Antes da cirurgia, a consulta com o anestesista se deu por telefone. "Ele só perguntou se eu tinha alguma alergia. Como era a realização de um sonho, algo que eu queria muito, eu confiei na palavra do profissional", lamenta. 

Após as reclamações de Renata, o médico então teria sugerido reparação nos procedimentos, mas a mulher já não confiava mais no cirurgião, pois, segundo ela, ele teria vazado informações pessoais suas para outras pessoas. Sem retorno sobre a situação e com o corpo deformado, ela expôs os fatos nas redes sociais e começou a chamar a atenção de outras mulheres que também relatam erros médicos e outras condutas realizadas pelo profissional. Na sexta-feira, 15 de abril, Renata tomou uma medida extrema e ao não ser recebida pessoalmente pelo médico, despiu-se na clínica particular, ficando apenas de calcinha sutiã na sala de espera do consultório. 

Renata passou a denunciar o caso em suas redes sociais e a fazer lives relatando o que estava sofrendo. Segundo ela, desde o procedimento, agravou-se um quadro de depressão e ela teria tentado suicídio por mais de uma vez. 

Insatisfeito com a exposição, o médico processou a mulher. O fato foi confirmado por ele e por seu advogado. 

A denúncia de Renata encorajou outras mulheres que supostamente também foram vítimas de erros médicos causados pelo cirurgião. 

Outras vítimas

No grupo criado por Renata se encontram quinze mulheres, todas pacientes do mesmo médico e que tiveram problemas com suas cirurgias. Criado com a intenção de compartilharem suas histórias, no local foram trocadas imagens chocantes das pacientes, que se viram unidas pelo trauma da violência sofrida pelo profissional.

Mariana Santos*, confirmou que faz parte do grupo e que resolveu se juntar após ver o relato de Renata. Em agosto de 2019, ela chegou ao consultório em busca de uma lipoaspiração e foi convencida a fazer também uma abdominoplastia.

"Ele disse que não garantia a cirurgia, só garantia se eu fizesse uma lipo e uma abdominoplastia, e a gente confia na orientação do profissional. Eu acredito que não tinha muita pele para fazer uma abdominoplastia, dois dias depois do procedimento minha barriga começou a abrir, cabia um punho, tive infecção, quase morri", conta relembrando os momentos de horror.

Mariana afirma ainda que, assim como ela, as outras também foram convencidas a realizar procedimentos que não eram os desejados. Em seu caso, ela chegou a ser perguntada se pretendia ter mais filhos e, ao indicar que não, o médico sugeriu que ela fizesse também uma laqueadura, e ela, motivada pela emoção, também aceitou o procedimento.

Quando perguntada se os procedimentos feitos em conjunto aumentariam o valor final da operação, ela explicou que não, mas que, pelo contrário, o médico oferecia facilidades e vantagens para que elas fizessem outros procedimentos estéticos.

"Para todas nós do grupo ele só facilitou, o que me motivou a fechar o procedimento com ele foi justo isso, a facilidade, ele consegue colocar uma parte [do valor] pelo plano de saúde e a gente paga só a outra parte, isso leva os pacientes a fecharem com ele", continuou.

Atualmente a paciente move um processo de danos morais contra o cirurgião em busca de uma indenização, pois, segundo ela, os gastos referentes aos tratamentos para reparar os erros médicos foram maiores do que os da própria cirurgia.

Márcia Rios* outra mulher que operou-se com o médico, conta que procurou Renata ao ver seus vídeos nas redes sociais.  Ela fez uma cirurgia de implantação de silicone no início do mês de novembro do ano passado e, logo após o procedimento, observou que as próteses estavam irregulares, uma maior que a outra, em locais diferentes. 

“Aleguei isso para ele na consulta e ele disse que era uma questão de tempo”. Três meses após a cirurgia, em outra consulta, o médico sugeriu que ela fizesse um enxerto para tirar gordura da barriga para colocar no seio, pagando somente os custos hospitalares.

Imagem mostra seio deformado de paciente após procedimento estético supostamente realizado em Maceió


“Até então eu não sabia de todas essas denúncias. Uma semana antes da gente fazer a cirurgia de reparo, eu vi o vídeo de Renata e procurei ela e decidi por não fazer a cirurgia, eu fiquei com medo, não gosto nem de lembrar disso. Só hoje eu chorei horrores. Eu faço parte do grupo e acabei de colocar [no grupo de Whatsapp] uma colega que também foi vítima dessa prática”, detalhou.

Judicialização


Duas das mulheres vítimas do médico são atendidas pela advogada Júlia Nunes, do AME, uma Organização Não Governamental sem fins lucrativos que acolhe mulheres vítimas de violência de forma multidisciplinar.

Segundo a advogada, outras mulheres do grupo também serão atendidas por ela. Inicialmente, aponta, o processo seria civil , mas pela grande demanda e gravidade será feita uma denúncia criminal nos próximos dias.

De acordo com a AME, há situações de diferença na simetria entre as mamas, possíveis mutilações nos órgãos femininos, além de problema também na região do umbigo. A advogada que representa as mulheres também alega que não houve assistência no pós-operatório.

“O dano moral é o de menos, o que queremos é a suspensão do CRM [Conselho Regional de Medicina]”, afirmou a advogada.

O que diz o médico

Em entrevista ao Jornal de Alagoas, ele reiterou que o caso de Renata não passa de uma tentativa de vitimização e extorsão. 

"Essa paciente é uma paciente provavelmente psiquiátrica e tá querendo me difamar, que está sendo processada por mim. Ela já tentou vários suicídios, posta isso, então assim, ela tá querendo me usar de escada, me extorquir. Ela está sendo procurada por agiotas que eu já soube, então assim, ela está querendo divulgação na mídia, tá mandando vídeos, veio a minha clínica sexta-feira fez um escândalo aqui e nós fizemos uma queixa crime contra ela. Quarta-feira tem uma audiência com o delegado, ela se despiu na frente de crianças, atentado violento ao pudor, ato obsceno, a polícia teve que vir para contê-la, totalmente desequilibrada", defendeu-se o médico. 

Segundo o médico, Renata tem procurado mulheres que supostamente tiveram queixas contra ele, mas que nunca o procuraram. "A intenção dela é mandar para todos os jornais para ganhar visibilidade e não procurar o caminho correto que é a Justiça. Ela tá desrespeitando uma liminar que é não falar o meu nome sob pena de multa. Ela descumpriu essa medida. Ela chegou a sugerir que eu comprei a sentença ao juiz, é uma coisa gravíssima". 

Perguntado sobre as acusações de outras mulheres, que inclusive mostram conversas relatando a insatisfação com os procedimentos realizados por ele, que afirmou que essas pacientes foram angariadas por essa mulher (Renata). "Paciente só sai da minha sala satisfeito, agora se, por acaso, denúncias de cinco anos atrás, se a paciente nunca me procurou, como eu vou saber se ela tá insatisfeita?", questionou. 

Em nota enviada à imprensa, o médico alegou que até a data de hoje não era de seu conhecimento a denúncia do AME e ressaltou que não há nenhum tipo de laudo pericia ou qualquer evidência que corrobore com a alegação de suposto erro médico de minha parte. Tampouco condenação judicial ou ética.

Confira a nota completa:

Nota de Esclarecimento 

Inicialmente, é importante esclarecer que, até hoje, não era de meu conhecimento a denúncia da Associação AME. Ressalto que não há nenhum tipo de laudo pericial ou qualquer evidência que corrobore com a alegação de suposto erro médico de minha parte. Tampouco condenação judicial ou ética.

Complicações pós-cirúrgicas há anos são descritas pela literatura médica e previstas em Termo de Consentimento. Sua existência não implica automaticamente na responsabilidade do profissional médico, podendo decorrer por diversos fatores alheios ao ato médico.

Desde 2009, realizo cerca de 400 cirurgias plásticas por ano, sendo membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e realizando continuamente cursos de especialização no Brasil e no exterior.

Como profissional da saúde, minha prioridade é seguir as normas éticas que regem a profissão, utilizando conhecimento atualizado e me esforçando ao máximo para garantir a saúde e o bem-estar de meus pacientes. Dessa forma, reitero meu compromisso com uma prática médica ética, responsável e de alta qualidade.

Sigo à disposição para sanar quaisquer dúvidas que possam surgir.

*O NOME DAS MULHERES FOI ALTERADOS PARA PRESERVAR A IMAGEM DAS MESMAS