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"Sonho em vê-la formada no ABC": Mãe cobra vaga em escola de Maceió para filha autista
Jessica Barbosa diz que presença da criança em escola ajudaria no tratamento da filha
É na casa simples de porta metálica, dois quartos, sala, cozinha e corredor de entrada, localizada em uma das ladeiras que dá acesso à Grota do Pau Darco, no bairro do Jacintinho, periferia de Maceió, que vivem Jessica Barbosa, de 32 anos e sua filha, Clara Hadassa, de 5, portadora do Transtorno do Espectro Autista (TEA) de nível 3, o mais severo.
“Eu sonho um dia ver minha filha formada no ABC. Se for possível, eu quero que ela leia, que ela escreva. Minha filha tem direito como todas as crianças”, diz Jessica à reportagem do Jornal de Alagoas, na sala da residência, enquanto a avó Meire acompanha de perto a pequena Clara, que brinca com o controle da televisão e assiste desenhos infantis.
A mãe segura em mãos uma decisão da Justiça alagoana que determina que o município matricule a criança no Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei) Rosane Collor ou em outra unidade próxima à sua casa. A decisão foi ignorada pela Secretaria Municipal de Educação (Semed), que sugeriu apenas que a mãe continuasse tentando fazer a pré-matrícula de maneira convencional, online, até o fim do prazo, neste domingo (14).
O método, porém, já foi tentado sem sucesso pela genitora em 2023 e ela teme que a filha permaneça por mais um ano fora da escola. “Minha filha ao invés de progredir no tratamento, corre o risco de regredir”, lamenta.
A pequena Clara é autista não verbal, possui seletividade alimentar, o que implica que ela consuma apenas alimentos pastosos, usa fraldas, pois não sabe avisar quando quer ir ao banheiro, tem dificuldades para enxergar e se movimenta na ponta dos pés.
“Cadê essa rede de apoio que falam tanto? Cadê esses direitos que as crianças autistas têm para colocar em prática?”, questiona Jessica.
“Eu quero somente que minha filha possa ir à escola, isso me ajudaria 100%, sonho em vê-la terminar o ano letivo, vê-la com outras crianças, quero ver minha filha numa escola em que tenha uma festinha de natal, uma festa de dia das crianças, de dia das mães. Até hoje eu nunca pude ter isso ela”, completa.
Divorciada, Jessica conta não receber nenhum apoio do pai de Clara, nem mesmo a pensão, estipulada pela Justiça em R$ 250,00. A única fonte de renda da família são os recursos obtidos através da Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) e garante apenas a compra dos alimentos específicos para a filha e também das fraldas.
Luta por escola
Antes de entrar na Justiça por uma vaga na educação infantil no município, a família buscou escolas particulares e também não foi acolhida. “Perguntavam se ela era especial e diziam que não recebiam, outras apontavam que não valia a pena separar apenas uma cuidadora para ficar com ela”.
Orientada pela Defensoria Pública, ela entrou com uma ação na 28º Vara da Infância e da Juventude de Maceió, que determinou que Clara fosse matriculada no CMEI. Após 15 dias sem respostas da Semed - prazo determinado pela Justiça, a mãe foi até a secretaria e servidores alegaram que a decisão da Justiça não garantia que a criança conseguisse a vaga e voltou a sugerir a pré-matrícula online. “A questão é que a pré-matrícula dá preferência a quem já estudou na rede municipal, que não é o caso da minha filha”, explica.
“Vivo para ela”
Recepcionista em uma loja para noivas, Jessica deixou o trabalho após a gravidez de Clara, que nasceu prematura às 25 semanas de gestação.
“Hoje eu vivo para ela, moro com meus pais que não tem aposentadoria e hoje a gente vive do salário dela”.
Jessica diz falar por outras mães e espera que a sua história possa sensibilizar autoridades e entes públicos para levar a sério e aplicar as poítica de direitos às crianças e pessoas autistas.
“São muitos direitos, mas na prática, para mim, nada funciona. Penso estar andando para frente, mas ando para trás. Há muita coisa que é falada, mas na prática é mais difícil”, comenta.
Ela cita ainda que a vaga na escola ajudaria a cuidar de si própria e também ter mais autonomia. “Para cuidar dela eu tenho que estar bem. Tem a saúde dos meus pais que já são idosos. Ela é uma criança ativa, então eu tenho que ter força, tenho que estar com saúde, então corro mil léguas para garantir o que ela precisa. É um direito dela e eu vou até o fim”.