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Refugiados de vários países buscam emprego no Brasil para mudar de vida
Melania Ngongue Weka, de 40 anos, é natural da Angola, mas deixou sua terra natal há 1 ano e 8 meses. Ela saiu de lá com os seus cincos filhos e está tentado reconstruir sua vida aqui no Brasil.
Ela conheceu o Brasil em 2013 depois de passar um mês aqui com um sobrinho que jogava futebol e tentava uma vaga em alguns clubes do país. Quando precisou deixar a Angola, Melania pensou em Portugal, mas os trâmites burocráticos dificultaram a ida e as boas lembranças do país fizeram ela buscar refúgio no Brasil.
“Eu achei o Brasil legal. O Brasil e a Angola são países irmãos. A gente entende as coisas daqui, assiste as novelas”, conta Melania. Ela deixou o seu país por causa de problemas no seu casamento, que quase resultaram na sua prisão.
No seu pais de origem, ela era dona de um mercadinho e uma lan house. Ao deixar tudo e vir para o Brasil, ela teve que se manter com suas economias até conseguir um emprego. Sem uma oportunidade em vista, Melania abriu um mercadinho perto da sua casa em março deste ano. “Eu fui atrás de emprego, mas não conseguia. Todo mundo falava que meu currículo era bom, mas não conseguia nada”, lembra.
Mas, a história de Melania mudou quando ela participou do projeto "Empoderando Refugiadas", que busca ajudar as mulheres refugiadas a conhecer seus direitos, se inserir no mercado de trabalho ou a empreender no Brasil. A iniciativa é do Grupo de Direitos Humanos e Trabalho da Rede Brasil do Pacto Global, com a Agência das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), a ONU Mulheres, a Caritas São Paulo, a empresa de recursos humanos Fox Time e o Programa de Apoio para a Recolocação dos Refugiados (PARR).
Há quatro meses ela conseguiu um emprego como auxiliar de serviços gerais na cozinha da Sodexo em um hospital em Santo André, na Grande São Paulo. Com o mercadinho, ela se divide entre as duas atividades e conta com a ajuda dos seus filhos mais velhos, que cuidam do negócio quando ela não está.
Refugiados no Brasil
Melania faz parte do grupo de 8.863 refugiados que estão no Brasil, segundo o último relatório do Ministério da Justiça, de abril deste ano. Eles são de 79 nacionalidades diferentes, sendo as principais: sírios, angolanos, colombianos, congoleses e palestinos. Desse total, 3.557 têm entre 18 e 59 anos, idade em que a população está inserida no mercado de trabalho.
Houve um aumento de 127% no número total de refugiados reconhecidos no Brasil entre 2010 e 2016. Em 2010, eram 3.904 refugiados.
A lei brasileira entende que o abrigo só pode ser concedido para quem provar sofrer perseguição por motivo de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas em seu país.
São realizadas entrevistas pessoais com o solicitantes, além de consultas a bases de dados dos demais órgãos membros do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), incluindo consultas ao Ministério das Relações Exteriores e à Polícia Federal, no intuito de definir o “fundado temor de perseguição” ou a situação de “grave e generalizada violação de direitos humanos”.
Segundo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado em junho, o número de pessoas deslocadas por motivos de conflitos e perseguições em todo o mundo chegou a 65,3 milhões em 2015. O número é quase 10% maior em relação ao registrado em 2014, que foi de 59,5 milhões.
Para Luiz Fernando Godinho, porta-voz da Acnur no Brasil, o país tem uma lei bastante avançada, que mantém as fronteiras abertas e inclui a sociedade civil na discussão sobre os refúgios. “No que diz respeito ao trabalho, mesmo os solicitantes têm uma carteira de trabalho provisória para que eles possam integrar o mercado formal”, afirma.
Ele ressalta que existem alguns desafios enfrentados pelos refugiados como dificuldade no idioma, revalidação de diplomas e o atual cenário da economia brasileira, que obrigou as empresas a enxugar seus quadrados de funcionários.
“O trabalho é fundamental para qualquer pessoa. A assistência humanitária é apenas parte do processo. O objetivo final é promover mecanismos para que a pessoa se vire com as próprias pernas”, afirma Godinho.
Para Marcelo Vitoriano, gerente de diversidade e inclusão da Sodexo, o resultado do trabalho dos refugiados na empresa foi muito positivo. “Isso faz bem para o negócio. Quanto mais diverso o público interno, melhor ele vai atender o público para quem presta serviço. A diversidade e a inclusão fazem bem para as pessoas e para os negócios. Acaba sendo um potencial competitivo”, diz.
Pedidos de refúgio
Em 2015, o Brasil teve 28.670 pedidos de refúgio, um pouco a mais do que em 2014, quando o país recebeu 28.385 solicitações. Em 2010, o número era de 966, segundo relatório do Ministério da Justiça. O Haiti lidera entre os países com mais pedidos de refúgio com 48.371 solicitações já feitas na história. Em seguida estão: Senegal (7.206), Síria (3.460) e Bangladesh (3.287).
Muitos haitianos conseguem agilizar seus pedidos de documento no Brasil, como a carteira de trabalho, ao procurar a Polícia Federal e solicitar refúgio. Segundo o Ministério da Justiça, os haitianos são migrantes que buscam oportunidades de emprego e renda inexistentes em seu país.
Buscando oportunidades
Alcius Elmira, de 27 anos, é haitiano e está no Brasil em julho de 2014. Ele é casado e tem dois filhos que ficaram no Haiti. Formado em farmácia e com cursos técnicos em enfermagem e produtos químicos, ele veio para cá em busca de oportunidades para melhorar a vida da sua família. “O país está sempre em crise e o governo não ajuda. Eu estudei tanto e poderia ajudar o país. A maioria viajou para outros países para ter uma vida melhor”, conta.
Ele trabalha no setor de montagem e expedição de exames da Papaiz Associados. Ele entrou na empresa em agosto de 2014, ficou por 9 meses e saiu para tentar uma vaga melhor para juntar mais dinheiro para mandar para a família. Conseguiu um outro emprego como zelador de uma igreja à noite e acabou voltando para o antigo emprego. Agora, ele concilia as duas atividades.
Seu projeto, além de continuar ajudando a família, é trazer a esposa e os filhos para o Brasil em 2017. “Primeiro queria tentar visitar, porque ainda não fui desde quando cheguei, e depois trazer eles para cá para a minha esposa trabalhar também”, afirma.
Para Luiz Roberto Capella, gestor administrativo ainanceiro da Papaiz Associados, o retorno com a contratação foi grande. Além de Elmira, outros quatro haitianos foram contratados. “Eles são integrados, participativos e trazem uma grande colaboração devido suas experiências vividas. Mostram na prática aos demais colaboradores que dificuldades podem ser superadas, se existe vontade”.