Nacional

Bolsonaro foi alertado das consequências de não ouvir a ciência

Ex-ministro da Saúde culpa o Presidente sobre a situação do País

Por Redação com BBC News 04/05/2021 18h06
Bolsonaro foi alertado das consequências de não ouvir a ciência
TV Senado

O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta prestou depoimento nesta terça (04) a senadores na CPI da Covid, que investiga ações de omissões de autoridades na pandemia.

Questionado pelos senadores se houve alguma proposta técnica do presidente Jair Bolsonaro ao ministério quando estava na pasta, Mandetta afirmou que não é que "o que havia ali era um mal estar".

"O que havia ali era um outro caminho, que ele decidiu, não sei se através de outras pessoas ou por conta própria", afirmou. "Era muito constrangedor explicar porque o ministério estava indo por um caminho e o presidente por outro."

Mandetta também afirmou que Bolsonaro foi alertado das consequências de não ouvir a ciência, inclusive com a projeção de alto número de mortes caso as medidas indicadas pela OMS não fossem seguidas.

"Todas as recomendações, as fiz. Em público, nos boletins, nos conselhos de ministros, diretamente ao presidente, a todos os secretários de Saúde", afirmou Mandetta. "Nunca tive discussão áspera, mas sempre coloquei (as recomendações) de maneira muito clara."Também afirmou que o isolamento social teria sido uma medida adequada no início da pandemia, quando era ministro. "Naquele momento era fundamental que se fizesse uma fala uma em relação à prevenção e que se fizesse o isolamento", afirmou.

"Primeiro porque tínhamos baixo número de casos. E porque essa doença entrou pelos ricos, estava no hospital Albert Einstein, no hospital Sírio-Libanês."

O senador Renan Calheiros lembrou que o presidente da República se colocou contra o isolamento e defendeu o chamado "isolamento vertical", que seria apenas isolar idosos e vulneráveis.

Mandetta já havia dito durante a sessão que uma das mentiras que o ministério teve que combater foi a "teoria de isolamento vertical" (de isolar apenas idosos) — algo que era defendido pelo presidente Bolsonaro.

O foco dos senadores é descobrir o quanto Bolsonaro interferiu nas ações do ministério e se a postura de Bolsonaro contribuiu para a aceleração do contágio e do número de mortes causadas pelo coronavírus no Brasil, que já superam 400 mil. A Comissão Parlamentar de Inquérito é composta majoritariamente por senadores oposicionistas e independentes, com 4 dos 11 senadores governistas.

Mandetta afirmou que não foi diretamente pressionado pelo presidente a tomar medidas contrárias ao que era recomendado pela ciência, mas que foi publicamente confrontado, o "que dava uma informação dúbia à sociedade".

"Sim, a postura (do presidente) trouxe um impacto (negativo). Você tem que ter, na pandemia, uma fala única. Esse vírus ataca a sociedade como um todo. Ele ataca o sistema de saúde a ponto de derrubá-lo", afirmou.

O depoimento de Mandetta na CPI começou com atraso, porque a sessão virou campo de batalha entre governistas e opositores.

Os senadores governistas pediram para fazer uma questão de ordem e reclamaram do fato de que os primeiros depoimentos são relativos à investigação das ações do governo federal. Eles queriam que houvesse alternância de depoimentos de pessoas que depusessem em relação à investigação sobre uso de recursos para o combate à pandemia nos Estados.

O ex-ministro Nelson Teich, que ficou menos de um mês no cargo após Mandetta e saiu pelos mesmos motivos, também será ouvido.