Política
Ação do MP contra prefeitura visa garantir transporte gratuito a pessoas com HIV
O Dia Mundial de Luta Contra a AIDS é celebrado no dia 1º de dezembro por uma decisão da Assembleia da Organização Mundial de Saúde, realizada em outubro de 1987, com apoio da ONU. No Brasil, a data passou a ser adotada, a partir de 1988. E foi exatamente neste dia simbólico que a 61ª Promotoria de Justiça da Capital - Direitos Humanos e Cidadania - ajuizou uma ação civil pública (ACP), com pedido de tutela de urgência, em desfavor da Prefeitura Municipal de Maceió e da Superintendência Municipal de Transporte e Trânsito (SMTT). O objetivo é garantir que o poder público conceda transporte gratuito para todas as pessoas portadoras de HIV que residem na capital alagoana.
A concessão dessa gratuidade já é um direito, segundo o promotor de Justiça Flávio Gomes da Costa Neto, autor da ação. Porém, segundo dele, a Prefeitura decidiu por fazer modificações legislativas que acabaram por suprimir essa garantia aos pacientes. “A postura adotada pelo Município de Maceió fez com que a letra da lei prejudicasse o acesso ao transporte público por parte das pessoas que têm o vírus, exigindo que as mesmas tivessem não só o HIV no corpo, mas também a AIDS. Ou seja, que elas estivessem acometidas da fase mais gravosa da doença. E isso dificultou a continuidade do tratamento de inúmeros pacientes. Muitos deles não possuem condições de ter tantos gastos com a compra de passagem de ônibus”, explicou o promotor.
“Nesse sentido, depois de várias reclamações de usuários que tiveram os créditos cancelados ou não concedidos, buscamos que a Prefeitura realizasse uma interpretação mais ampliada da lei, incluindo as pessoas portadoras de HIV, porém, isso não ocorreu. Então, em função dessa resistência, preparamos a ação, que tem o objetivo de incluir os pacientes novamente no programa de gratuidade. Eles não podem ter seus tratamentos comprometidos. O direito à saúde tem que ser garantido”, acrescentou Flávio Gomes da Costa Neto.
A ação está sendo protocolada no dia 1 de dezembro, como um ato simbólico e que pretende além do transporte gratuito para este público-alvo, jogar luz no combate a proliferação e conscientização sobre a doença.
A lei que fere o direito
Na ação, o Ministério Público Estadual relata que recebeu inúmeras reclamações de pessoas que foram impedidas pela Prefeitura de Maceió de continuar recebendo crédito para utilizar o transporte coletivo. Segundo os denunciantes, a Lei nº 4.635/97, que, em seu artigo 2, concedia a gratuidade para os portadores da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS), foi alterada ano passado pela nova Lei nº 6.730/15. A norma, que foi aprovada pela Câmara de Vereadores, disciplina as novas regras e condições para o direito à gratuidade no pagamento de tarifas do sistema de transporte público de passageiros em Maceió. O texto mais recente diz que os beneficiários, além de serem portadores de HIV, “devem também estar acometidos de determinadas doenças oportunistas”.
“A nova redação no nosso entender é deveras restritiva, uma vez que mesmo sem desenvolver doenças oportunistas, os portadores do HIV têm necessidade e direito a este benefício. A concessão dele tem o objetivo de oferecer melhores condições, não só para o tratamento contínuo e seguro, mas contribuir para a integração social destas pessoas, incentivando-as a evitar o isolamento e se locomoverem em busca de atividades que possam enriquecer sua existência, facilitando, o quanto possível, que elas continuem a produzir e participar das atividades na sociedade e, em especial, para irem aos postos de saúde aderirem ao tratamento da doença”, diz um trecho da ação.
“Os portadores de HIV sofrem grande isolamento social decorrente do preconceito ainda existente. Além disso, vivem na iminência de ter problemas de saúde mais gravosos e necessitam fazer exames médicos com frequência, sendo também indispensável o regular acompanhamento médico. Então, a este público objeto da ação, é preciso a garantia ao transporte gratuito, para preservar a dignidade humana. É de suma importância a continuidade e periodicidade do tratamento destes pacientes, pessoas pobres, até porque a lei abrange só até dois salários-mínimos. A falta de passagens para estes, dificulta duas características essenciais ao tratamento, periodicidade e acompanhamento psicológico. O tratamento periódico diminui a quantidade de vírus, reduzindo a chance de se infectar por outras doenças; há o tratamento psicológico, que evita surtos e problemas de ordem psíquica de portadores; e, por fim, a dificuldade que se tem para marcar consultas, sendo o oferecimento do transporte essencial, neste aspecto, para a facilidade de deslocamento dos portares de HIV, independente ou não de terem AIDS. O transporte gratuito garante acesso universal ao tratamento multidisciplinar, necessário sempre e mesmo sem a intercorrência de doenças oportunistas, como quer exigir a nova lei”, completa a ACP.
“Vale lembrar, que a evolução natural do HIV no indivíduo portador que não seguir ou parar seu tratamento, é o óbito. Já que o HIV/Aids não tem cura”, alertou o promotor de Justiça.
O pedido do MPE/AL
A 61ª Promotoria de Justiça da Capital requere ao Judiciário para que seja determinada, de forma imediata, a volta da gratuidade aos pacientes que têm HIV. “O Código de Defesa do Consumidor autoriza o magistrado a antecipar o provimento final, liminarmente, e a determinar, de imediato, medidas satisfativas ou que assegurem o resultado prático da obrigação a ser cumprida. Esta regra é aplicável a qualquer ação civil pública que tenha por objetivo a defesa de interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo. No presente caso, é imperiosa a concessão de medida liminar com esse conteúdo tutelar preventivo, já que estão perfeitamente caracterizados os seus pressupostos, uma vez que estamos tratando de uma doença sem cura e de alto contágio. Estes dois aspectos resultam em alta probabilidade de aumento do problema, uma vez que interrompido o tratamento, o/a infectado/a aumento as suas chances de infectar outras pessoas, crescendo o número de infectados, fora que estando sem tratamento, como vimos, aumenta as suas chances de contrair doenças oportunistas, desenvolvendo o quadro de AIDS, o que representa não só um prejuízo do ponto de vista individual, mas também social (coletivo), já que terá que acessar os instrumentos públicos de saúde”, argumenta o Ministério Público.
“Assim, requer-se, inicialmente e de plano, uma vez presentes os requisitos legais, a liminar com a antecipação dos efeitos da tutela judicial para que, dentro de lapso temporal de maior brevidade possível, o Município de Maceió, através da SMTT, promova a inclusão de todos os soropositivos, seja, com HIV ou com HIV/AIDS, para receberem como beneficiários da isenção tarifária, a concessão mínima de créditos de quatro passagens diárias, sob pena de não o fazendo, o Município pagar multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), desde que não faça a concessão dos créditos diários, valores estes, a serem depositados em conta judicial, para serem revertidos com a finalidade exclusiva em favor da luta de combate a doença HIV/AIDS”, completa a ação civil pública.
O Ministério Público ainda pede que, caso a gratuidade continue sendo negada, seja estabelecido o pagamento de multa pessoal e diária de R$ 1000,00 (mil reais) ao prefeito Rui Palmeira e de R$ 500,00 (quinhentos reais) ao superintendente da SMTT, Dário César.