Política
Com bloqueio de verba, setores do governo correm risco de paralisia
Ministério da Economia tenta administrar reclamações feitas pelas pastas
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Uma compressão sem precedentes no Orçamento federal colocou em alerta o governo, que agora monitora o risco de paralisia em programas de ministérios nos próximos meses por falta de dinheiro.
Resultado do estrangulamento de verbas, a liberação de bolsas de estudo já foi suspensa, e atividades da Polícia Federal estão prejudicadas. O Ministério da Economia tenta administrar reclamações feitas pelas pastas, que têm apresentado demandas em busca de mais recursos para evitar um "apagão" em setores da máquina pública.
Enquanto isso, a equipe técnica trabalha na finalização da proposta para o Orçamento de 2020. O primeiro Orçamento elaborado sob a gestão de Jair Bolsonaro (PSL) tende a ser ainda mais apertado que o deste ano.
O Congresso ainda não aprovou o projeto que traz as diretrizes para as finanças públicas no ano que vem. Mesmo assim, o governo terá de apresentar a proposta final para o Orçamento de 2020 nas próximas duas semanas, já que o prazo para envio ao Legislativo vence no próximo dia 31.
Neste ano, a disponibilidade das chamadas despesas discricionárias atingiu o patamar mínimo histórico. São exemplos desses gastos, definidos como não obrigatórios, o custeio da máquina pública e investimentos.
O governo iniciou 2019 com um montante previsto de R$ 129 bilhões em despesas discricionárias. Porém, o fraco desempenho da economia e a frustração na arrecadação de tributos levaram a bloqueios de R$ 33 bilhões nos ministérios.
Com isso, o valor disponível em gastos não obrigatórios caiu para aproximadamente R$ 97 bilhões, patamar considerado baixo. Efeitos da limitação de verbas que atingiu a maior parte dos órgãos do governo já começam a ser observados na prática. Nesta quinta (15), o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico) anunciou a suspensão de aproximadamente 4.500 bolsas de iniciação científica, mestrado e doutorado que seriam distribuídas às universidades.
Nesse primeiro corte, estudantes que já possuem bolsa não devem ser afetados. O órgão afirma, porém, que a partir de setembro não terá mais recursos para pagar as cerca de 84 mil bolsas ativas.
Um dos cortes feitos neste ano atingiu a compra de livros didáticos para escolas públicas. O Ministério da Educação, que sofreu o maior bloqueio, está com R$ 6,2 bilhões travados e conta com a recomposição dos recursos até o fim do ano para a continuidade de programas.
Na PF, o aperto atinge programas de qualificação, viagens e investigações. Em São Paulo, um dos maiores centros do órgão, os treinamentos de tiro foram interrompidos. O pagamento de diárias e passagens para os policiais federais também está limitado.
Delegados relatam que bases de inteligência que atuam para reforçar operações, como na repressão ao tráfico de drogas, devem ser reduzidas.
Até agora, operações que envolvem a produção de passaportes estão mantidas. Em 2017, a PF suspendeu a emissão por restrição de verba.
Segundo o Ministério da Justiça, os R$ 305 milhões disponibilizados para os serviços relacionados a passaportes são suficientes para 2019.
Na área habitacional, construtoras afirmam que R$ 470 milhões em repasses do programa Minha Casa Minha Vida estão atrasados. Em nota, o Ministério de Desenvolvimento Regional disse que cumpre rigorosamente a destinação dos recursos.
Cálculos da consultoria de Orçamento da Câmara apontam ainda que, fora do Executivo, a Justiça do Trabalho também pode sofrer com a falta de recursos. Os gastos seguem em crescimento mesmo após a reforma trabalhista, que reduziu fortemente o número de ações na área.
Uma das principais bandeiras do ministro da Economia, Paulo Guedes, é a defesa da flexibilização do Orçamento. Ele argumenta que é preciso retirar amarras que levaram as despesas obrigatórias, como Previdência e folha de salários, a superar 90% do total disponível.
Um dos problemas enfrentados pelo governo é o chamado empoçamento de recursos. Apesar da escassez orçamentária, ministérios simplesmente não conseguem executar toda a verba disponível. O dinheiro não pode ser realocado para áreas que precisam de reforço.
Em junho, o empoçamento ficou em R$ 15 bilhões. O dinheiro sem uso se acumula, principalmente, na Saúde, na Defesa e na Educação, além de emendas parlamentares.
A dificuldade é vista no Ministério da Justiça, responsável pela PF. Enquanto falta orçamento em algumas áreas da pasta, sobram recursos em outras, como no Fundo Penitenciário, que normalmente encerra o ano com sobras orçamentárias que acabam devolvidas ao Tesouro Nacional.
Para membros da área econômica, é pequeno o risco de o país passar neste ano pelo chamado "shutdown", quando a limitação de recursos chega a um nível crítico que leva a uma paralisia geral dos serviços públicos.
Técnicos do Ministério da Economia acreditam que mais órgãos devem suspender serviços sob a alegação de que acabou o dinheiro, mas sem um efeito generalizado na máquina pública.
A preocupação é com a situação a partir de 2020, quando, na avaliação de membros do governo, ministérios podem ficar inviabilizados.
Isso porque, enquanto as despesas obrigatórias seguirão em alta, as discricionárias serão ainda mais comprimidas, já que o país está sob a regra do teto de gastos, que impede o crescimento das despesas acima da inflação.