Política
Renan Filho vai vetar projeto que muda estrutura do MPAL
A votação da proposta com emendas abriu uma crise institucional, sem precedentes na história recente, entre a Assembleia Legislativa de Alagoas e Ministério Público Estadual
A votação do Projeto de Lei Complementar (PLC) 73/19, que altera a Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL) com emendas abriu uma crise institucional, sem precedentes na história recente, entre a Assembleia Legislativa de Alagoas e Ministério Público Estadual.
A aprovação da matéria em segundo turno, durante a sessão ordinária desta quarta-feira com apenas um voto contra, acirrou os ânimos entre os representantes dos dois órgãos, que se manifestaram através de notas oficiais. De um lado, representantes do MPAL alegam que os deputados querem acabar com grupos especializados, a exemplo do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
Os deputados negam essa possibilidade e garantem que os grupos de atuação do MPAL poderão continuar existindo. Para isso seria necessário aprovar leis específicas. Os parlamentares reagiram e revelaram que o PLC 73/19 tinha vários penduricalhos que aumentava os vencimentos de promotores e procuradores do Ministério Público, a exemplo de auxílio-alimentação e várias gratificações.
Após a aprovação do projeto, Renan Filho recebeu dirigentes do MPAL no Palácio dos Palmares na tarde dessa quarta-feira, e deu sinais de que vai vetar o projeto. Após a reunião, o governador confirmou ao Jornal de Alagoas que o projeto deve retornar para a Assembleia Legislativa: “vou vetar o projeto. Acredito que esse é o melhor caminho, pois pode abrir a possibilidade para uma discussão mais ampla”, afirmou.
A votação
Com 22 deputados presentes na sessão desta quarta-feira, 11, o plenário da Assembleia Legislativa de alagoano votou diversas matérias, dentre elas, o projeto de lei complementar nº 73/2019, de autoria da Procuradoria Geral de Justiça, que objetiva atualizar a legislação alagoana relacionada à estrutura orgânica e ao estatuto dos membros do ministério público brasileiro, à luz das inovações constatadas no sistema jurídico e observados os anseios da sociedade.
A matéria, que teve o voto contrário da deputada Jó Pereira (MDB), foi aprovada com emendas. A proposição conta com oito capítulos e 185 artigos e tem como escopo reunir, copilar, e consolidar, no âmbito do Estado de Alagoas, as normas nacionais que estruturam e disciplinam o funcionamento do Ministério Público brasileiro.
Após a votação, o deputado Davi Maia (DEM) foi a tribuna da Casa para explicar as mudanças aprovadas no plenário referentes ao PLC 73/2019. Ele esclareceu que Casa não acabou com o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), como estão falando.
“Isto é mentira. O que esta Casa fez foi afirmar que para qualquer instituição, seja Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas ou Governo do Estado, que queira fazer alguma mudança no seu organograma interno, é necessário enviar um projeto de lei para a Assembleia Legislativa”, disse.
Como exemplo desta prática, o deputado disse que o Ministério Público do Estado de São Paulo, para criar a Comissão da Maria da Penha dentro do próprio órgão, teve que enviar uma lei para a Casa legislativa de lá. “O que nós queremos apenas é legislar, proteger o parlamento, o Orçamento do Estado de Alagoas e a sociedade" , afirmou.
Davi Maia disse ainda que, se o Ministério Público encaminhar ao Legislativo um projeto de lei criando o Gaeco de forma legal, terá o seu voto. “Isso aconteceu com a 17ª do Tribunal de Justiça”, destacou. O deputado também disse que votou a favor da emenda que designa um delegado da Polícia Civil de Alagoas como chefe das operações desencadeadas no Estado. “Concordei também com a emenda que trás para esta Casa a decisão sobre o aumento salarial dos membros do Ministério Público, porque assim tem que ser como qualquer servidor público estadual, seja ele o governador, conselheiro do Tribunal de Contas, promotor ou professora”, afirmou.
O deputado Cabo Bebeto (PSL) declarou que a ideia da proposição é regulamentar de forma correta o Gaeco. “Queremos que tudo seja feito a luz da legalidade para que amanhã não se venha a questionar as próprias ações do grupo. Eu me comprometo que, se amanhã chegar um projeto criando o Gaeco de forma adequada, eu votarei a favor”, afirmou.
O deputado Bruno Toledo (PROS) disse que a questão do Gaeco é uma "cortina de fumaça" para criticar a pauta. “A instituição merece todo meu respeito. Mas o tema é sensível já que trata do fim dos penduricalhos do Ministério Público e a legalização dos grupos de trabalho da instituição. “A Assembleia Legislativa só está querendo participar das discussões, dando legalidade aos grupos criados como aconteceu com a 17º Vara da Capital”, disse.
Bruno Toledo afirmou ainda que o Ministério Público é uma instituição que merece todo o respeito da Casa, mas que também precisa ser criticada. “O Ministério Público é uma instituição séria, mas que não está acima do bem e do mal e trabalha com dinheiro público. Nesta proposição, por exemplo, acabamos com auxílio alimentação e com os salários que eles mesmos tratavam por lá. Sempre estaremos unidos junto à sociedade por instituições fortes, mas cada um fazendo sua parte constitucional”, concluiu.
Veja as notas
Do Poder Legislativo do Estado de Alagoas:
É importante expor o que ainda não foi dito aos alagoanos a respeito das legítimas emendas parlamentares ao Projeto de Lei Complementar 73/19, que altera a Lei Orgânica do Ministério Público de Alagoas. Neste sentido, segue a verdade:
1. O Projeto instituía auxílio saúde e auxílio alimentação no limite de 5% do subsídio, mais adicional por atuação funcional suplementar em mutirões no patamar de 2% do subsídio, além de adicional de 1% por atuação funcional suplementar em plantões e adicional de 7% por difícil provimento.
2. O Ministério Público, como fiscal da lei, deveria observar o texto constitucional e respeitar o livre funcionamento do Poder Legislativo, bem como a ação legítima de seu colegiado. A Carta Magna, que consagra aos integrantes do MP generosa remuneração, exclusiva e por subsídio fixado em parcela única, vedou também o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, conhecidos como penduricalhos.
3. Até agora não foi dito que o mencionado Projeto propunha a equiparação com os magistrados, apesar de a Constituição Federal impedir a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para efeito de remuneração de pessoal do serviço público.
4. Por enquanto, pelas redes sociais, vozes isoladas externam irresignação em torno da postura do Parlamento de perceber a impossibilidade de manter órgãos colegiados executivos, em razão de ofensa à figura do promotor natural e de constitucionalidade extremamente duvidosa.
5. Além disso, as mesmas vozes externam inconformismo pelo impedimento aos promotores de justiça de acessarem ao cargo de Procurador Geral de Justiça, tal como já ocorrem em São Paulo e outros Estados da Federação.
6. O Parlamento, que observa o princípio da separação de poderes e o sistema de freios e contrapesos, repele a tentativa de desqualificar a prerrogativa do legislador. Lembra, por fim, da criação da 17ª Vara, de titularidade coletiva, cujo projeto de lei passou pelo crivo e aprovação do Poder Legislativo, que ofertou seu apoio ao fortalecimento da luta contra a criminalidade.
O Poder Legislativo reafirma suas prerrogativas constitucionais de legislar, fiscalizar e representar os interesses do povo. Neste sentido, corrige distorções e aponta o caminho da formulação de lei para fixação de subsídios e criação de órgãos colegiados. Por fim, reitera o compromisso em defesa das instituições, tendo o diálogo permanente como caminho para a harmonia e o desenvolvimento.
Maceió, 11 de março de 2020.
Do Ministério Público:
A Constituição é clara: o Ministério Público foi criado com a função de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis, ou seja, aqueles dos quais a cidadão não pode abrir mão, como a vida, a liberdade e a dignidade. Isso significa, em síntese, que a missão da instituição é proteger direitos e combater o crime nas suas mais diferentes esferas de atuação, funcionando como um justo fiscal do cumprimento das leis e da Constituição brasileira. E, para que assim trabalhe, o ordenamento jurídico confere inúmeros poderes ao Ministério Público.
Interferir na forma como o Ministério Público age, reduzir prazos para favorecer o arquivamento de procedimentos e extinguir grupos especiais, como o GAECO e o GAESF, que tanto se dedicam ao combate à corrupção e à sonegação fiscal e ao enfrentamento às facções criminosas em Alagoas, é uma forma de penalizar promotores e procuradores de justiça pelos seus acertos praticados. Além disso, ao contrário do que foi argumentado pela Assembleia Legislativa de Alagoas, a Lei Orgânica do Ministério Público (nº 15/99) tem, sim, em seu texto, o capítulo que fala sobre os grupos especiais.
Acabar com o CAOP e todos os seus núcleos - Defesa da Infância e Juventude, Defesa dos Direitos Humanos, Defesa do Meio Ambiente, Defesa da Mulher, Defesa da Saúde Pública, Defesa do Consumidor, Defesa do Patrimônio Público, de Combate à Criminalidade, de Perícias e de Educação - é deixar a sociedade órfão de colegiados que dedicam todo o seu material humano à promoção de políticas públicas capazes de melhorar a vida daqueles que precisam do braço forte do Ministério Público.
Certo de que as alterações são inconstitucionais e desejam fragilizar o Ministério Público de Alagoas, a instituição já começou a trabalhar para evitar que esse desmonte se concretize. Em reunião ocorrida na tarde desta quarta-feira (11), no Palácio República dos Palmares, o procurador-geral de justiça, Márcio Roberto Tenório de Albuquerque, acompanhado de outros 14 membros, entre procuradores e promotores de justiça, pediu ao governador do estado, Renan Filho, que vete integralmente o PLC nº 73/19. Sensível ao pleito formulado pelos membros do MPAL, o chefe do Poder Executivo defendeu o fortalecimento de instituições como o Ministério Público, e disse que está “integralmente de acordo” com a demanda pleiteada e que órgãos como o GAECO e o GAESF “colaboram com a proteção do uso do dinheiro público”.
Acreditando que o veto governamental virá em breve, a chefia do Ministério Público vai aguardar que esse ato de Poder Executivo se concretize para, então, fazer gestão junto a Assembleia Legislativa no sentindo de fazê-la entender a importância da aprovação do PLC nos moldes em que ele foi enviado, ainda no ano passado, visando exclusivamente adequar a Lei Orgânica do Ministério Público à luz das inovações constatadas no sistema jurídico e observados os anseios da sociedade.
Márcio Roberto Tenório de Albuquerque Procurador-Geral de Justiça em exercício