Política
Presidenciáveis veem golpe de Arthur Lira em proposta de sistema semipresidencialista
Há rejeição à mudança do atual sistema para dar mais força ao Congresso; proposta de atualizar lei do impeachment encontra maior apoio
Uma das bandeiras de Arthur Lira (PP-AL), na Câmara dos Deputados, é o semipresidencialismo. Para os pré-candidatos à presidência da república nas eleições de 2022, a pauta de Lira é considerada “golpe”, “fonte de instabilidade política”, de acordo com levantamento feito pela Folha de São Paulo.
Foi apontada uma rejeição unânime à proposta, que propõe modificar o atual sistema político e dar mais força ao Congresso.
Ciro Gomes (PDT-CE) foi incisivo contra a mudança. “É golpe porque, na minha opinião de professor de direito constitucional, parlamentarista que eu sou, fiz campanha pelo parlamentarismo, mas o plebiscito [de 1993 em que quase 70% dos eleitores rejeitaram o parlamentarismo] transforma o presidencialismo em cláusula pétrea", afirma.
"Nem sequer emenda é constitucionalmente tolerável porque o poder constituinte originário, o povo, votou explícita e claramente, por folgada maioria, pelo presidencialismo."
Ciro afirma ainda que, se a PEC (proposta de emenda à Constituição) avançar na Câmara, vai entrar na Justiça para barrar a medida.
O ex-juiz Sergio Moro (União Brasil) - que nos últimos dias afirmou ter desistido por ora de se lançar, mas depois voltou atrás – avaliou o semipresidencialismo, "com a elevada fragmentação partidária brasileira, seria uma fonte de instabilidade política."
O tucano João Doria, governador de São Paulo, afirma que o debate é válido, mas não deveria ocorrer em ano eleitoral. "Qualquer mudança constitucional, especialmente sobre os sistemas eleitoral e de governo, deve ser feita com amadurecimento, antecedência e previsibilidade", diz Doria.
Assim como Ciro, o deputado André Janones (Avante-MG) também qualifica o semipresidencialismo como golpe.
"Na prática, olhando o cenário Brasil, o sistema semipresidencialista tira do eleitor o direito de escolher quem vai governar e entrega o governo a grupos fisiológicos, tal como o que já ocorre hoje no governo Bolsonaro, só que de forma institucionalizada."
Pré-candidata do MDB, a senadora Simone Tebet (MS) diz que uma mudança no sistema político precisaria ter origem na vontade popular.
"Eu particularmente até tenho uma simpatia pelo parlamentarismo, mas não pode ser a minha voz a dizer isso. O semipresidencialismo ou semiparlamentarismo, aí tanto faz [o nome], que é uma jabuticaba brasileira, que lá trás também tinha uma certa simpatia minha, ela tem que ser entendida no momento atual. Será que é isso mesmo que nós precisamos, de um semipresidencialismo com esse Congresso?", questiona.
Felipe D'ávila, pré-candidato do Novo, critica o número de partidos políticos no país e defende uma reforma política que contemple o voto distrital misto e o aumento da cláusula de barreira.
"Com essas mudanças, pode-se discutir o sistema de governo, como o semipresidencialismo ou o parlamentarismo, que tem minha preferência", diz.
A pré-candidata Vera Lúcia (PSTU) defende "uma grande mudança nesse sistema que esta aí, que serve aos grandes capitalistas que financiam os partidos", mas considera que o semipresidencialismo é uma proposta oportunista do centrão e que não busca "dar mais liberdades e mecanismos democráticos ao povo."
A Folha enviou questionamentos sobre o tema ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a Bolsonaro. A assessoria de Lula afirmou que o petista "ainda não definiu candidatura" e, por isso, não faria comentários. Já a Secom (secretaria de Comunicação) do governo não respondeu.
Ambos, porém, já se manifestaram publicamente sobre o assunto. No dia 19, em Londrina (PR), Lula criticou o Congresso e a discussão sobre a mudança de governo.
"Não conseguiram aprovar o parlamentarismo com dois plebiscitos, então vão tentar uma mudança na Constituição para criar o semipresidencialismo. Você elege um presidente, pensa que vai governar, mas quem vai governar é a Câmara, com orçamento secreto para comprar o voto dos deputados, para fazer todas as desgraceiras que estão fazendo."
Já Bolsonaro, em novembro de 2021, disse que a ideia de discutir o semipresidencialismo era "idiota."
"Tem certas coisas que é tão idiota que não dá nem para discutir. Agora, eu falo que jogo dentro das quatro linhas [da Constituição]. Quem sair fora, daí, eu saio, sou obrigado a combater o cara fora das quatro linhas", disse no palácio da Alvorada.
Semipresidencialismo
O semipresidencialista é uma espécie de parlamentarismo em que o presidente da República conserva um pouco mais de poder nas mãos em relação ao parlamentarismo tradicional e menos do que no presidencialismo atual.
O presidente, eleito pelo voto direto, seria o chefe de Estado, comandante supremo das Forças Armadas e com o poder de dissolver a Câmara em caso de grave crise política e institucional. O presidente é o responsável por indicar o primeiro-ministro, que é quem governará, de fato, com o conselho de ministros.
Na Câmara, a minuta de PEC do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) prevê que o primeiro-ministro seria escolhido preferencialmente entre os membros do Congresso, por voto da maioria absoluta dos parlamentares.
Além disso, o plano de governo deve ser aprovado pelo Congresso. Ou seja, o semipresidencialismo dá ao Congresso mais poder do que ele tem hoje. Na avaliação do presidente da Câmara, o modelo é uma forma de "estabilizar mais o processo político dentro do Congresso Nacional".
A ideia de Lira é debater o tema neste ano, para possível entrada em vigor a partir de 2030. Para isso, ele criou, em meados de março, um grupo de trabalho com prazo de 120 dias.
O colegiado, coordenado por Samuel Moreira, é composto por deputados e assessora por um conselho consultivo encabeçado pelo ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Nelson Jobim e formado pelo ex-presidente Michel Temer, por ex-ministros do STF e por juristas.
*Com informações da Folha de São Paulo