Política
Vereador de Maceió debocha de publicação do movimento negro que criticava PL de sua autoria
A lei que foi aprovada na Câmara da capital de Alagoas é considerada inconstitucional por especialistas
O Bancada Negra, coletivo que faz parte do movimento negro alagoano, publicou em seu Twitter nesta quarta-feira, 15, uma conversa com o vereador de extrema-direita Leonardo Dias (PL). Após uma crítica feita ao parlamentar sobre seu projeto de lei aprovado pela Câmara de Maceió que expõe mulheres que têm direito ao aborto legal a uma série de procedimentos que detalham os riscos e consequências dessa prática, Leonardo Dias ironizou e respondeu a reportagem com “Bom dia” e emoji de coração.
O Bancada Negra é um movimento encabeçado por duas mulheres negras: Alycia Oliveira, mestra em geografia pela Ufal e Estefanie Silva, estudante de administração da mesma instituição e presidente do PSOL Alagoas.
Na publicação, o movimento pedia que as pessoas pressionassem para que o PL do vereador não avançasse, considerando que o projeto, segundo eles, perverso, pretendia “tortura as mulheres que podem abortar legalmente em caso de: estupro, risco de vida, ou feto acéfalo… “, diz trecho da postagem.
A lei que foi aprovada na Câmara da capital de Alagoas é considerada inconstitucional por especialistas, ou seja, o projeto do parlamentar confronta a Lei do Minuto Seguinte, aprovada pela Câmara Federal em 2013 e ainda em vigência. Sendo assim, vítimas de violência sexual têm direito a atendimento obrigatório e gratuito no minuto seguinte à agressão.
Confira:
Após a aprovação, o Projeto de Lei - PL, foi encaminhado para o prefeito de Maceió JHC (PL), que poderá sancionar ou vetar o projeto.
Também nas redes sociais, a Bancada Negra destacou que a aprovação do projeto surge ainda após a revogação da Portaria no Governo Federal através do Ministério da Saúde que obrigava os hospitais públicos a acionarem a polícia sempre que houvesse um caso de aborto legal. “A violência fez um cerco e as mulheres estão na mira”.
Especialistas como médicos, advogados e entidades ligadas ao tema consideram o PL do parlamentar Leonardo Dias uma tortura às mulheres. No Brasil, o aborto é permitido por lei em casos de gravidez decorrente de estupro, risco à vida da gestante ou anencefalia do feto, e deve ser oferecido gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Ainda segundo a Bancada, a PL também obriga os servidores da saúde a falar para os familiares e para a mulher que ela pode seguir com a gestação sob a perspectiva da adoção. “Como se não bastasse a violência, ainda tem que lidar com isso”, diz outra parte do trecho.
Para a médica, Marília Magalhães, a lei é tortura. Ela explicou ao portal Eufemea, do Cada Minuto, que como em qualquer procedimento médico, as pacientes em caso de aborto legal, são orientadas pela equipe médica, bem como assinam termo de consentimento livre e esclarecido.
“Afinal, a mulher precisa saber o que pode acontecer com seu corpo e tem autonomia para decidir”, enfatiza. A médica esclarece que se formos pensar em riscos, é cientificamente comprovado que o aborto seguro tem 14 vezes menos chances de complicações que o parto propriamente dito.
“Não há na literatura, por exemplo, nenhum relato de teratogenia no aborto medicamentoso, como muito se falava no passado”, explicou. Ainda segundo ela, a lei proposta pelo vereador revitimiza meninas e mulheres que, até chegarem ao direito do aborto legal, já passaram por diversos processos físicos e psicológicos.
“Isso é tortura. É tentativa de fazer a vítima rever, repensar diante de uma situação já violenta o suficiente, seja se foi fruto de estupro ou por algum outro motivo como risco de vida materna, por exemplo”, frisa.
A proposta segue repercutindo negativamente nas redes sociais, pois é embasada em estudo de médicos contrários ao aborto, sendo também criticada pelo Centro de Defesa dos Direitos da Mulher (CDDM) e pela vereadora Teca Nelma (PSD), que se absteve de participar da votação.
O CDDM definiu a medida como um patrulhamento ideológico contra a liberdade do corpo da mulher. "A criminalização do aborto mata e patrulhar a mulher em um momento de fragilidade é uma violência moral, psicológica e institucional para além das que ela já sofre e sofrerá fazendo o procedimento", disse a coordenadora do CDDM e também advogada, Paula Lopes.
Paula disse ainda que medidas de proteção e acompanhamento para essas mulheres deveriam ser priorizadas pelos vereadores.
Ela completa afirmando que seria interessante os vereadores(a) pudessem criar políticas de acolhimento, onde essas mulheres pudessem ter apoio psicológico de verdade, garantido pela rede pública para serem retiradas das condições de violência a que muitas estão submetidas
O que disse o vereador
“É claro que essa PL apoiada pelo “Movimento Pró-Vida” só podia ser de autoria do vereador Leonardo Dias, que justifica a ação de tortura dizendo que: “serve para que a mulher tenha dimensão do ato que vai fazer”. É um absurdo vindo de uma ignorância sem tamanho”, disse outro do trecho do coletivo negro.
Em entrevista ao g1 Alagoas, Dias disse que não vê polêmica no PL e que não está legislando sobre o aborto, "mas garantindo um direito de informação à paciente".
Ele pergunta qual é o problema de alguém ter informação sobre todas as consequências de um procedimento cirúrgico ao qual vai se submeter. E responde, que para ele, nenhum. “Nos casos permitidos por lei, a decisão legal permanece com quem sempre esteve, a própria mulher", explicou.