Política
Lula herda divida bilionária de governo Bolsonaro
Os números foram extraídos pela Folha do painel Siga Brasil
O governo de Jair Bolsonaro (PL) deixou R$ 6,3 bilhões do seguro-desemprego para a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pagar no início de 2023.
A atual equipe do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) admitiu em nota que houve insuficiência orçamentária no fim de 2022, em outras palavras, não havia como pagar todas as parcelas do benefício previstas para aquele ano.
As despesas foram quitadas com o orçamento já do governo Lula e, na visão de técnicos, parecem ter gerado uma bola de neve. No fim de 2023, nova insuficiência orçamentária obrigou a pasta a empurrar gastos com o seguro-desemprego para o começo de 2024, num montante calculado até agora em R$ 5,66 bilhões.
Os números foram extraídos pela Folha do painel Siga Brasil. Após serem procurados pela reportagem, o Tesouro Nacional, a Secretaria de Orçamento Federal e o MTE fizeram uma reunião técnica em 29 de fevereiro para discutir o problema.
Depois do encontro, o Ministério do Planejamento e Orçamento disse em nota que os órgãos estão em tratativas para a “correção dos procedimentos de execução dessas despesas”, mas não detalhou o diagnóstico nem quais soluções serão adotadas.
O MTE informou que os segurados receberam os pagamentos em dia e não foram afetados, mas não explicou as razões da insuficiência orçamentária. A pasta disse que “envida esforços” para executar todas as obrigações e solicitará novos créditos, caso seja necessário.
O Tesouro foi procurado em 27 de fevereiro, mas preferiu não responder.
A correção da execução dessas despesas pode gerar pressão no Orçamento, pois seria necessário reduzir outros gastos. Por isso, pessoas envolvidas nas discussões afirmam que a solução não virá “da noite para o dia” e demandará gradualismo.
A natureza do problema está na cronologia da execução orçamentária.
A Lei de Finanças Públicas diz que o empenho da despesa (primeira fase do gasto) deve ocorrer no momento da criação de uma obrigação de pagamento. Já a liquidação (segunda fase) consiste na verificação do direito adquirido de quem vai receber o dinheiro.
Ao homologar um pedido de seguro-desemprego, o governo se compromete a pagar de três a cinco parcelas ao trabalhador. Para a CGU (Controladoria-Geral da União), esse reconhecimento já equivale à liquidação da despesa, e o ministério deveria empenhar e liquidar o valor de todas as prestações, ainda que o direito de saque seja exercido só nos meses seguintes.
O MTE tem fugido desse roteiro e empenhado as despesas apenas no mês de pagamento. Na prática, isso permite ao ministério contratar um gasto sem registrá-lo no Orçamento, enquanto o espaço disponível é usado para outras ações. Em mudança de governo, a conta fica para o sucessor.
O problema foi abordado pela CGU em auditoria nas contas do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) de 2021 que indicou R$ 2,01 bilhões em benefícios homologados sem o empenho nem a inscrição em restos a pagar para o ano seguinte.
A cifra era maior que a dotação disponível (R$ 343,4 milhões). Ou seja, R$ 1,67 bilhão em despesas contraídas nem sequer possuíam autorização legislativa, “em confronto às regras orçamentárias”, diz o relatório.
A CGU atribuiu a irregularidade à decisão do governo Bolsonaro de reduzir as dotações do seguro-desemprego na reta final de 2021, ano marcado por apelos do centrão por liberação de emendas e pela pressão do então presidente para turbinar gastos sociais de olho nas eleições de 2022.
*Folha de São Paulo